quarta-feira, 8 de abril de 2009



08 de abril de 2009
N° 15932 - MARTHA MEDEIROS


Bíceps mal utilizados

Aconteceu nas recentes férias de verão. Estávamos eu e minhas filhas dentro do carro, estacionadas num mirador de frente para o mar, esperando o sol se pôr bem na nossa frente, enquanto apreciávamos os veleiros e ouvíamos bossa nova, ou seja, só faltava entrar o logotipo de algum cartão de crédito dizendo que certas coisas não tem preço e blablablá.

Conversa vai, conversa vem, estacionou ao lado do nosso carro um outro carro. Era um casal que, pelo visto, também curtia um drive-in natureba. Ele eu não consegui ver direito, mas ela era inesquecível: uma loira estonteante de blusa bem decotada e exibindo uns 50 centímetros de bíceps. Normal. Travestis também curtem uma cena de cartão-postal.

Estávamos, assim, todos numa boa compartilhando a despedida da tarde, quando a loira abriu o vidro do carro, colocou o bração pra fora e jogou um saco enorme de salgadinho no chão. Fechou o vidro e continuou a apreciar a natureza que ela ajudava um pouquinho a destruir. Não tive dúvida: desci do carro, juntei o pacote, bati na janela e perguntei com o meu melhor sorriso: isso é seu?

Minhas filhas ficaram tensas, achando que meu gesto poderia parecer um ato de preconceito. Não, meninas. Travesti, padre, matador profissional, guarda noturno de zoológico, garota fantástica, goleador do Milan, diretor de escola de samba, não importa quem seja: um mínimo de consciência se exige. Há menos de 10 metros havia uma lixeira.

Se a moça não queria desfilar seus bíceps para o povo, que pedisse para o seu acompanhante levar a embalagem vazia ao lugar que lhe era destinado, ou então que esperasse chegar em casa para se desfazer dos restos mortais do seu lanche, mas largar a dois metros do mar é provocação.

Pois bem. Ela abriu a janela do carro bufando. Minhas filhas acertaram na mosca, a moça não gostou nadinha da minha intervenção. O que eu estava pensando, que era melhor do que ela? Resmungou qualquer coisa e fechou o vidro sem querer mais assunto, dando-se o direito de ser porca, afinal, não estamos numa democracia?

Segui com o pacote na mão e levei-o eu mesma até o lixo. Era o que eu deveria ter feito desde o início, mas são raros os momentos em que me descontrolo, e um deles é quando vejo alguém jogar uma garrafa plástica, uma carteira de cigarros ou qualquer outra embalagem no chão. Tendo oportunidade, vou até a pessoa e devolvo com educação e eufemismo: tome, você deixou cair.

Se a criatura tiver um mínimo de noção sobre cidadania, vai pegar seu lixo de volta e não repetirá a bobagem que fez. Mas a arrogância é tanta que não há eufemismo que dê jeito. Preconceito tenho é contra grossura – não a dos bíceps, que até aprecio muito, mas de atitude.

Aproveite o dia - Uma ótima quarta-feira Santa

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