quarta-feira, 30 de julho de 2008



30 de julho de 2008
N° 15678 - Martha Medeiros


O travesseiro

Eu estava na sala de embarque quando reparei naquele homem sisudo. Estava de terno escuro, gravata escura e tinha o semblante muito sério. Viajava sozinho. Não era um turista, percebia-se que iria voar a negócios. Segurava uma pasta executiva 007 numa mão. Na outra, um travesseiro.

Eu não conseguia tirar os olhos daquele travesseiro. Com fronha. Ela era branca com nuvenzinhas azuis. Um objeto íntimo nas mãos de um provável empresário que iria dormir num flat ou num quarto de hotel e que não colocaria sua cabecinha em nenhum outro travesseiro que não fosse o seu.

Comecei a entender melhor a expressão "vôo doméstico".

Tempos atrás, andar de avião era uma coisa chique. As pessoas se arrumavam bem, colocavam seu melhor casaco e não conseguiam disfarçar uma certa emoção (frisson seria a palavra apropriada). Mesmo sem querer, sentia-se no ar um quase esnobismo.

Definitivamente, não era uma galera de rodoviária. Estavam num aeroporto, um lugar onde tudo era límpido, elegante, iluminado e levemente erótico, a começar pela voz que saía dos alto-falantes anunciando a chegada e partida de outros eleitos.

Hoje uma voz anuncia, com certo tédio, que o embarque que seria efetuado no portão 6 será efetuado no portão 13 por causa do remanejamento das aeronaves, e que haverá um atraso de duas horas por falta de tripulação, e ninguém reclama, porque já tivemos dias piores (se bem que os dias piores podem voltar com a greve dos aeroviários).

Hoje vale tudo: viajar de chinelo, barriga de fora e travesseiro na mão. A questão do travesseiro é instigante, porque é sabido que tem gente que não consegue mesmo dormir longe do seu.

E há apegos ainda mais radicais. Uma vez, ouvi uma moça perguntando a outra por que ela levava uma mala tão gigantesca para passar apenas um final de semana fora. Resposta: porque ali dentro estavam seu travesseiro e seu edredom.

O edredom era de estimação também.

Eu sei que são inúmeros os afeiçoados ao próprio travesseiro. É como a menina que não viaja sem sua boneca, o menino que não sai de casa sem levar seu carrinho: são objetos que nos dão a sensação de que não estamos partindo totalmente.

Podemos estar sem pai nem mãe nesse mundão de Deus, mas trazemos algo do nosso lar. É um conforto mais espiritual que material.

Já eu acredito que viajar é sempre uma aventura e que devemos estar preparados para as surpresas que virão, incluindo o travesseiro do alheio, que pode não ser o ideal para nossa coluna torta. Mas há quem não aceite que vida é risco.

O fato é que já vi gente com as mais diversas e corriqueiras bagagens de mão: térmica, cuia, raquete, violão, Bíblia, berimbau, cachorrinho, crianças, mas chegar ao aeroporto pela manhã com o travesseiro ainda quente e com a fronha babada é, no mínimo, um ato de extrema personalidade. Bem que fazem. Dormem feito anjos.

Embora São Pedro continue de mal com a gente que tenhamos todos uma ótima quarta-feira.

segunda-feira, 28 de julho de 2008



RESUMO DAS NOVELAS

Estou desatualizado.

Não dou mais conta de todas as novelas que a televisão oferece. Outro dia, tomei uma decisão radical, corajosa e necessária: assistir, ao menos, a um pedaço de cada uma das novelas em exibição atualmente na televisão aberta brasileira. Fiquei de língua de fora.

A lista é interminável: 'A Favorita', 'Água na Boca', 'Amor e Intrigas', 'Beleza Pura', 'Cabocla', 'Caminhos do Coração', 'Chamas da Vida', 'Chiquititas', 'Ciranda de Pedra', 'Coração de Estudante', 'Lalola', 'Malhação', 'Pantanal', 'O Privilégio de Amar' e 'Os Mutantes'. Estou certo? Não?

Será que algumas já terminaram e nem percebi? O problema é tempo, pois tenho de assistir a todos os jogos do Inter e, como secador, aos do Grêmio, sem contar os de outras equipes que possam atrapalhar o caminho colorado.

Quero ser um profissional da televisão: ver todos os jogos e todas as novelas. No futebol, a grande trama é: jogar com três zagueiros e três volantes ou com três zagueiros e dois volantes ou, enfim, com dois zagueiros e dois volantes, salvo se for uma boa opção dois zagueiros e três volantes.

É complexo, mas a gente se acostuma e entra no jogo. A trama das novelas é ainda mais rebuscada: quem está comendo quem, quem deixou de comer quem e quem vai comer quem nos próximos capítulos. Confesso que todas essas possibilidades me fascinam.

Pena que não prestei atenção naquelas aulas de análise combinatória da disciplina de matemática. Outra variação forte das novelas é esta: uma vez, dois homens, por exemplo, pai e filho, disputam a mesma mulher. Na outra, duas mulheres, por exemplo, mãe e filha, disputam o mesmo homem.

Pode-se complexificar a intriga, em tempos de liberação de costumes, com três homens disputando e ficando com a mesma mulher ou três mulheres disputando e ficando com o mesmo homem. É para isso que servem sobrinhos e primos.

Futebol e novelas são iguais. Tudo depende de esquema. Tático: 3-5-2, 4-4-2 ou, no meio, onde tudo embola, novelesco, 2-2, 3-3 ou, em casos de vale tudo para ganhar, 4-4 ou 5-5.

Eu aprendo muito sobre futebol vendo novelas. Novela é cultura. Futebol também. A personagem Flora, de 'A Favorita', interpretada por Patrícia Pillar, esposa de Ciro Gomes, passou 18 anos na prisão, onde aprendeu a ler francês.

Num capítulo que pude ver, depois de ter percebido que não adiantaria secar o Grêmio contra o Figueirense, ela aparece lendo meu amigo Michel Houellebecq. É a ex-prisioneira de mais bom gosto de que já ouvi falar.

Poucos críticos literários podem competir com ela. Nada de auto-ajuda ou livros da lista de mais vendidos da moda. Literatura maldita na veia. Flora daria uma boa treinadora de futebol. Aliás, quando vai aparecer uma treinadora?

Tem bandeirinha, juíza, homem treinando mulher, mas não tem, que eu saiba, mulher treinando equipe de futebol profissional. Inadmissível. Não me venham falar de uma impossibilidade por causa do vestiário. Como é que os treinadores de vôlei fazem?

Com novela e futebol é assim. Perde-se o fio da moeda. Quer dizer, da meada. É tricô. Vira conversa de bar. Não existe melhor maneira de jogar conversa fora. Todo mundo pode ser especialista.

Em novela e futebol, tudo é questão de sexo. Resumo das novelas: quem come quem. Do futebol: quem passa por cima de quem. Qual a diferença entre um colorado e um gremista? O gremista acha que futebol é coisa séria.

juremir@correiodopovo.com.br

Ótima segunda-feira ainda que com chuva e uma excelente semana para todos nós

sábado, 26 de julho de 2008



27 de julho de 2008
N° 15675 - Martha Medeiros


O uso dos palavrões

Não sei o que a craque em elegância e estilo, a adorável Gloria Kalil, pensa a respeito do uso de palavrões. Já li muita coisa escrita por ela, sei o quanto repudia barracos e valoriza a educação, sei que defende a idéia de que ninguém é chique se não for civilizado, mas não lembro de ter lido algo a respeito desse assunto.

É lógico que o palavrão faz parte da cultura popular de qualquer país, por isso, creio que Glorinha diria que o bom senso é que determina quando ele é tolerável e quando é grosseria.

Eu passei minha infância praticamente sem ouvir palavrões dentro de casa. Do meu irmão, muito pouco. Da minha mãe, quase nunca. E do meu pai, jamais. Ele achava feio até mesmo dizer "que saco".

Até que cresci e os palavrões começaram a ser mais bem aceitos, desde que nunca como forma de ofensa e agressão, apenas como manifestações de enfado, raiva e em momentos de descontração e humor. Mas da boca do meu pai, nunca ouvi, até hoje. E é o que basta para esse tema me despertar certo fascínio.

No Brasil, já foram catalogados mais de 3 mil palavrões. Na França, 9 mil. Na Inglaterra existe até o Dicionário de Insultos em Cinco Línguas, o primeiro guia prático destinado a turistas que são obrigados a lidar com bagagens perdidas, reservas malfeitas, café frio, serviço ruim e contas exorbitantes.

Poucos são os que ainda negam a utilidade do palavrão para radiografar uma determinada sociedade, seus costumes e tendências.

Até alguns anos atrás, era de Jorge Amado o recorde de uso de palavrões por um único autor brasileiro, mas creio que esse feito já deve ter sido ultrapassado, pois é um recurso cada vez mais recorrente na nossa literatura, assim como no teatro e cinema.

Aliás, o cinema brasileiro, na década de 70, atormentou nossos ouvidos com o uso indiscriminado do palavrão. Tudo bem que, no auge da repressão, o palavrão era uma resposta ao silêncio, aliviava tensões, funcionava como catarse, mas abusaram.

Hoje ele é usado com mais pertinência e adequação, o que não significa comedimento: filmes como Cidade de Deus e Tropa de Elite seriam completamente absurdos se não reproduzissem fielmente a linguagem das ruas e dos morros.

Eu não ouvia palavrão em casa, mas lia muito Charles Bukowski, então me salvei. Hoje solto meus palavrõezinhos fraternos em situações rotineiras e grito impropérios em momentos de alta-tensão, o que me torna uma pessoa razoavelmente normal. Ainda assim, ainda há uma menininha dentro de mim que se sente desconfortável com exageros e vulgarizações.

Sei que Dercy Gonçalves deu enorme contribuição à cultura brasileira, que teve uma folha corrida de respeito, que era uma pessoa meiga e até moralista: seu desbocamento nada mais era que uma marca registrada para sobreviver no meio artístico.

Compreensível, mas eu não achava engraçado. O uso do palavrão com o único propósito de escandalizar sempre me pareceu mais patético do que escandaloso de fato.

De qualquer forma, é impossível viver sem ele. Então o jeito é não sermos hipócritas, respeitá-lo dentro dos princípios da liberdade de expressão e, de preferência, manter uma certa razoabilidade no seu emprego.

Quando solto algum palavrão mais pesado na frente das minhas filhas, imediatamente peço desculpas. Na presença de pessoas de mais idade, evito a qualquer custo. E diante da Gloria Kalil, nem a pau.

Diogo Mainardi

O efeito da paternidade

Minha vida e a de meus filhos são aborrecidas como um programa educacional da TV canadense. Os acontecimentos mais prosaicos acabam ganhando uma utilidade pedagógica.

Qual é mais alto: o prédio de tijolos brancos ou o prédio de tijolos vermelhos? Consegue ler em voz alta o que este blogueiro pilantra escreveu sobre o papai?

No New York Times, num artigo publicado no último domingo, o jornalista David Carr fez um relato dos tempos em que era um celerado que espancava a mulher, comercializava cocaína e consumia ininterruptamente crack, LSD, peiote, maconha, cogumelo, mescalina, anfetamina, Quaalude, Valium, ópio, haxixe e todos os tipos de bebida alcoólica. A paternidade o transformou.

Depois de perder a guarda das duas filhas, ele resolveu abandonar as drogas, arranjar um emprego, recuperar a custódia das crianças e garantir-lhes uma vida serena.

Eu sempre fui um pai dedicado. Tenho um bom emprego e garanto uma vida serena aos meus filhos.

Hoje, depois de uma semana de férias com os dois, estou prestes a empreender o caminho inverso ao de David Carr, mergulhando no crack, LSD, peiote, maconha, cogumelo, mescalina, anfetamina, Quaalude, Valium, ópio, haxixe e todos os tipos de bebida alcoólica.

A paternidade se tornou um empenho permanente. Fico dia e noite com meus filhos. Falo apenas com eles e sobre eles. O museu é o museu dos meninos. O restaurante é o restaurante dos meninos. De maneira geral, os filhos tiveram esse efeito sobre mim: eles me apequenaram e me embruteceram.

Eles ocuparam minha mente como Antônio Conselheiro ocupou Canudos, impondo suas idéias primitivas e suas práticas regressivas. Questões que pareciam definitivamente superadas voltaram a me atazanar. Antes de ter filhos, eu abria um livro e indagava sobre Santo Agostinho.

Agora abro um livro e indago onde está Seymour, o bonequinho de madeira (Seymour, o bonequinho de madeira, está escondido dentro daquele pote cheio de lápis de cor).

Até recentemente, a paternidade era vista como uma atividade trivial, a ser cumprida com naturalidade. Em certos casos, com desprezo.

Agora é o oposto: o papel dos pais foi inchado, foi superdimensionado. Virei um behaviorista com meus pequenos Albert, permanentemente engendrando mecanismos para estimular seu desenvolvimento emocional e cognitivo.

Minha vida e a de meus filhos são aborrecidas como um programa educacional da TV canadense. Os acontecimentos mais prosaicos acabam ganhando uma utilidade pedagógica.

Qual é mais alto: o prédio de tijolos brancos ou o prédio de tijolos vermelhos? Eram dezoito paradas de metrô até Coney Island: se já fizemos sete, quantas paradas ainda faltam? Consegue ler em voz alta o que este blogueiro pilantra escreveu sobre o papai?

Neste momento, meu filho de 7 anos, por algum motivo, quer reconfigurar meu computador. E meu filho de 3 anos, por algum outro motivo, quer dar uma martelada em meu dedo. Onde está a mescalina? (A mescalina deve estar com Seymour, o bonequinho de madeira.)

Claudio de Moura Castro

Meu reino por uma tomada

"Por que melhora o comércio e piora o conforto do passageiro? Há um grande desafio a ser encarado: criar regras para que as empresas públicas ou monopolistas sirvam aos seus clientes, e não a si próprias"

Viciados em cigarros são cada vez mais raros. Em compensação, explode o número de viciados em notebooks. A Infraero conduz uma batalha cívica, cortando o suprimento do vício, a eletricidade.

Salas de espera de aeroportos congregam dezenas de dependentes. No Santos Dumont e no Galeão velho, a solução foi drástica: zero tomada. Nos outros aeroportos quase não há. Como viciado, levo um benjamim na pasta, para compartilhar as poucas existentes.

Ilustração Atômica Studio

A Infraero se preocupa também com a forma física dos passageiros. Para que pratiquem seu exercício diário, ela alonga a caminhada pelos corredores.

Em Guarulhos, quem desembarca na extremidade do terminal, já divisando a sua porta, tem de ir na direção oposta e contornar todo o edifício. Em Confins, é preciso ir ao final do corredor, a fim de descer a escada e, embaixo, voltar tudo para alcançar a saída.

O sistema de check-in é burro. Para quem comparece com reserva, o computador precisaria saber apenas se há malas. Um cartão digital (como o de milhas) desencadearia todo o processo. Aliás, com a informatização dos manifestos de vôo, a maquininha que lê o código de barras do viajante só serve para criar emprego.

Alguns aeroportos mandam tirar o notebook da pasta, outros não. Segurança depende de geografia? Faz sentido retornar ao check-in por causa de um saquinho plástico para a pasta de dentes? A Polícia Federal não descobriu que turismo é uma indústria como outra qualquer.

Defeitos de fabricação espantam clientes. Um exemplo: com mais da metade das cabines vazias, os estrangeiros são obrigados a agüentar filas enormes para mostrar seu passaporte.

Funcionários da Infraero que tenham ido à Disney (passagem de cortesia?) viram no aeroporto de Miami um carregador retirando as malas das esteiras e enfileirando-as ao lado. No Brasil, enquanto os estrangeiros pagam seus pecados em horrendas filas, suas malas congestionam as esteiras.

Cronometrei na semana passada: mais de uma hora para brotarem todas as malas no carrossel. É bem mais tempo do que para voar entre Rio e São Paulo. Ainda bem que a manutenção dos aviões não é feita pela Infraero.

Parte considerável dos viajantes já entrou na idade de se preocupar com colesterol e glicemia. Por que, então, tudo o que se vende nos bares dos aeroportos ou é gorduroso ou é doce? Em Washington, as concessões são obrigadas a cobrar o mesmo que em suas lojas na cidade.

Nos aeroportos brasileiros, um picolé custa mais que nos Estados Unidos. Heathrow (em Londres) oferece chuveiro de graça. Em Confins, custa 28 reais. Se não houvesse atrasos, talvez fossem aceitáveis as cadeiras desconfortáveis e com braços, empecilho para deitar.

Os pisos de borracha com relevo fazem as malas ressoar como motocicletas. A nova área de embarque do Santos Dumont, toda de vidro, seria perfeita em Helsinque, pois funcionaria como estufa, dispensando o aquecimento.

Mas no Rio de Janeiro o calor é intolerável, mesmo com ar condicionado. Há um banheiro no Galeão com uma saboneteira quebrada há cinco anos e um toalheiro há dois.

Aeroportos são ambientes privilegiados para exposições de arte, pois há espaço e tempo para apreciá-las. Contudo, o que nos expõem os daqui jamais seria aceito em galerias respeitáveis. Aeroporto é cartão de visita, não é camelódromo.

Nos Estados Unidos, os táxis podem "fazer lotação", e há tarifas próprias para tal. No Brasil, não podem. Além disso, têm de voltar vazios, pois não são autorizados a pegar passageiros. Com isso, dobram o consumo de gasolina, as emissões de carbono e os preços.

Desabafos de um viajante rabugento? É possível, mas antes de tudo evidenciam as dificuldades de fazer uma burocracia pública colocar a satisfação do cliente como seu principal objetivo.

Aliás, o único serviço competente no aeroporto é o free shop. Por que melhora o comércio e piora o conforto do passageiro?

Há um grande desafio a ser encarado: criar regras para que as empresas públicas ou monopolistas sirvam aos seus clientes, e não a si próprias.

Claudio de moura castro é economista - Claudio&Moura&Castro@cmcastro.com.br


26 de julho de 2008
N° 15674 - Nilson Souza


Barbudos

Uso barba desde os tempos de faculdade e por causa dela já passei por pequenos constrangimentos, como no dia em que um dos meus sobrinhos, com três ou quatro anos de idade, olhou fixo para o meu rosto durante algum tempo e perguntou:

- Tio, tu tem queixo?

Essa foi fácil de responder. Bem pior foi o que aconteceu com a tia de uma amiga, avó ainda relativamente jovem, que ouviu esta pergunta fulminante de sua netinha:

- Vó, tu conheceu dinossauro? Surpreendida, ela retrucou: - Cala a boca, menina!

Mas as crianças a gente enrola. Com adulto é mais difícil. Uma vez, no tempo em que usava uma barba pré-histórica, grande e mal aparada, fui jogar futebol de salão e resolvi esperar os companheiros de time sentado na escadaria de uma igreja.

Vestia uma calça de abrigo antiga, uma camiseta de jogo também meio surrada e tênis desamarrados. Passou um sujeito e me ofereceu uma esmola. Quando disse que não queria, ele se indignou: - Orgulhoso, hein?

Culpa da barba. Além de envelhecer, os pêlos escondem a verdadeira fisionomia do seu portador. Agora mesmo, todos vimos espantados a transformação que sofreu o ex-presidente da Sérvia. Acusado de crimes de guerra, ele passou mais de 10 anos escondido atrás da própria barba.

Mudou de rosto, falsificou a identidade e sequer precisou fugir do país. Ficou tão diferente, que era visto por seus próprios patrícios como outra pessoa - um pacato e inofensivo idoso, praticante de medicina alternativa.

O episódio reforçou a minha impressão de que os barbudos sempre escondem alguma coisa mais, além do próprio rosto.

Às vezes, coisas assustadoras, como o passado do governante sérvio. Outras vezes coisas inocentes, como uma timidez mal resolvida.

Mas não merecem ser vistos preconceituosamente, como fez um conhecido especialista em economia e política que andou por estas paragens no início de 2002 e sentenciou uma solene previsão sobre a terceira candidatura do petista Lula:

- Ele jamais será eleito. A população brasileira não confia em candidato de barba.

Dou mais uma dica sobre o desastrado previsor, que ainda dá os seu palpites na TV: ele não usa barba. Nós, os barbudos, temos pelo menos uma virtude: estamos sempre aptos a surpreender.

Dagomir Marquezi

Personagem da semana - Christian Bale Com mil salas multiplex, "Batman"!

Na tela, o ator vive O Cavaleiro das Trevas, o sucesso da temporada. Na vida real, foi detido por agredir a mãe

CAMPEÃO

Bale como Batman – o Cavaleiro das Trevas. O filme bateu a bilheteria do Homem-Aranha na estréia. Desde os anos 1940 somos convidados a entrar na batcaverna. E não saímos mais.

Hoje, novas (e velhas) gerações ficam acachapadas por duas horas e meia na poltrona do cinema assistindo a Batman – Cavaleiro Das Trevas. Em quatro dias de exibição, o filme (que custou US$ 150 milhões para ser produzido) já faturara US$ 244 milhões mundo afora.

Nem é preciso ser o secretário das finanças de Gotham City para imaginar que sua versão em DVD/BluRay será um dos presentes mais cobiçados do Natal.

O “dono” da batcaverna hoje é o britânico Christian Charles Philip Bale, filho de um militar com uma palhaça – o que, de certa forma, explica sua mistura de ousadia artística com tamanha disciplina. Bale pensou em ser dançarino, guitarrista e jogador de rúgbi.

Mas começou sua vida profissional onde muitos esperam terminar. Atuou aos 13 anos sob a direção de Steven Spielberg em Império do Sol. Depois se aventurou por Shakespeare, por musicais e arriscou-se com sucesso no perturbador Psicopata Americano.

Emagreceu até virar um pele e osso em O Operário. Sua escolha como o Batman do renascimento pode ter sido uma das melhores jogadas da série. Aos 34 anos, Bale dá completa credibilidade a tudo o que faz. Seu homem-morcego espanca covardemente o desarmado vilão Coringa numa cela.

Nem bem o filme é lançado, Bale foi acusado de agressão pela própria mãe e pela irmã. Na segunda-feira passada, foi detido em Londres pela polícia. Pouco depois foi libertado e deverá ser chamado para prestar mais esclarecimentos.

O potencial escândalo não arranhou 1 milímetro o prestígio de Bale nem a bilheteria de Cavaleiro das Trevas. Bale tem crédito para queimar por seus serviços como ator.

Tanto que deverá interpretar mais dois heróis míticos na seqüência: John Connors (na seqüência de O Exterminador do Futuro) e Robin Hood (em Nottingham). A gente acredita em tudo o que ele fizer. Cavaleiro das Trevas é mais que um sucesso absoluto. Virou fenômeno.

Com tanto som e tanta fúria em Dolby Digital, fica difícil acreditar que a lenda pessoal do playboy Bruce Wayne vai completar 70 anos no ano que vem.

E mais difícil ainda acreditar que a gente ainda leve a sério um sujeito que persegue malfeitores com uma roupa de mergulhador, capacete de orelhinhas e uma capa esvoaçante. Pois pagamos para ver.

Batman veio ao mundo na revista Detective Comics, edição de maio de 1939, em quadrinhos de Bob Kane. Todo mundo sabe: Bruce Wayne é um garoto rico que testemunha seus pais serem mortos por ladrões, enquanto morcegos sobrevoavam o local. Para suportar a perda, Bruce decide alternar a vida de playboy filantropo com a de justiceiro, meio drácula.

Quatro anos depois de surgir no papel, Batman já era um seriado de cinema. O ator Lewis Wilson foi o primeiro homem-morcego. Na década de 1950, a revista foi criticada por quem não gostava da intimidade entre Batman e seu protegido e parceiro adolescente, Robin. Eles dormiam na mesma cama.

‘‘A cidade de Gotham City é um patrimônio cultural da humanidade’’

Nos anos 1960, Batman virou mania mundial, como série cômica de TV. Adam West vestia o ridículo colante cinza e conseguia levar a sério seu personagem. (Em 1966, um longa-metragem foi produzido no mesmo esquema.)

A série se tornou uma referência pop. A lenda do homem-morcego sobreviveu ao próprio esculacho. Foi ressuscitado nos gibis – especialmente por Frank Miller – com uma releitura mais adulta, sombria e pesada.

O mesmo herói que nos fazia rir na tela de TV passou a beirar a loucura e enfrentar problemas existenciais. Nessa nova perspectiva, voltou ao cinema em 1989, com o improvável Michael Keaton por trás da máscara. Ele não tinha cara nem físico de super-herói. Mas vestiu a batcapa com convicção.

A ousada tacada do diretor Tim Burton foi um sucesso. O Batman do cinema chegou ao indiferente Val Kilmer, em Batman Forever, de 1995. Sucumbiu dois anos depois ao homem-morcego-com-mamilos de George Clooney (em Batman & Robin).

Com mil salas multiplex, Batman! Quando a batcaverna parecia ter sido soterrada para sempre, foi reaberta, em 2005, com Batman Begins, sob direção do enfant terrible de Hollywood Christopher Nolan.

Para as gerações mais novas, Batman tem a cara de Christian Bale. Michael Caine é seu fiel mordomo Alfred. E nada de Robin. Nada de gracinhas e insinuações gay. Você assiste a Cavaleiro das Trevas e nem parece ser um “filme de super-herói”.

Às vezes sugere um drama adulto, outras um filme de terror ou nosso noticiário de cada dia. O Coringa de Heath Ledger continua sendo um palhaço, como já foram Cesar Romero e Jack Nicholson.

Depois do gigantesco sucesso de Cavaleiro das Trevas, uma continuação é questão de mais dois ou três anos.

Batman, na pele de Christian Bale, está completamente renovado, em forma para a década de 2010. Certas coisas continuarão difíceis de engolir – como a total incompetência da população de Gotham City em descobrir a identidade secreta de Batman.

Mas Christian Bale acredita completamente no que está fazendo, como acreditou em cada um dos papéis que interpretou antes. Sua credibilidade virou uma espécie de aval para a lenda de Bruce Wayne.

Hoje, na prática, Gotham City é patrimônio cultural da humanidade. Somos todos um pouco batmans: cumprimos nosso papel social como “brucewaynes” durante o dia e somos donos da verdade na sombria noite de nossa psique.

O Coringa zomba de nossos planos, e suas gargalhadas insanas ecoam num canto escuro de nossa mente.

As acusações da mãe e da irmã contra Bale são apenas mais uma prova de que, neste nosso novo mundo de Batman, ninguém é super-herói.

quarta-feira, 23 de julho de 2008



23 de julho de 2008
N° 15671 - Martha Medeiros


A inocência dos vereadores

Algum tempo atrás, durante o programa Saia Justa, a jornalista Mônica Waldvogel fez uma divertida e enxuta definição sobre o gênero humano: mulher é chata, homem é bobo.

Tive que rir, porque a generalização, ainda que desfavorável para ambos os sexos, tem lá sua razão de ser.

Nós, mulheres, temos muitas qualidades, mas somos chatas. Dramatizamos tudo, nos apegamos a detalhes, não damos férias para nossas mágoas, temos vocação pra sargento, já nascemos adultas, e gente adulta demais é chata.

E os homens são maravilhosos, mas como são bobos. Ficam se comparando uns com os outros, têm o ego inflado, contam vantagens para disfarçar a insegurança, são eternos meninos. Você acha que não procede? Ah, procede.

Um exemplo disso foi parar no jornal ontem: cinco senhores de Carazinho, vereadores a serviço da vida pública, deram seu voto a favor para que a Câmara Municipal homenageasse as moças que trabalham numa danceteria, com a justificativa de que elas oferecem momentos de descontração a seus clientes. Podem ser mais bobos?

Uma notícia como essa, para quem tem bom humor, é um refresco entre tantas reportagens sobre tiroteios e mortes estúpidas. Eu achei engraçado.

Fiquei imaginando esses cavalheiros depois do expediente, ou mesmo em plenário, comentando sobre os ótimos serviços da boate Garotas da Gogo e tendo a idéia de fazer uma deferência pelos nove anos de aniversário da casa, sem achar que isso fosse gerar qualquer incômodo. Chego a ficar comovida com a pureza deles.

Homenagem, quem não gosta? Imagino que em Carazinho tenha um armazém comemorando cinco anos de funcionamento, uma farmácia completando 10 anos na rua principal, uma lotérica há 15 anos servindo à população, e todos esses estabelecimentos já devem, também, ter sido contemplados com uma moção comemorativa apresentada pela Câmara.

É bonito que os vereadores queiram homenagear não só esses, mas todas as classes de trabalhadores, sem exceção.

Talvez tenham pensado que uma consideração às moças contaria pontos junto à comunidade, pois demonstraria que os políticos da região não têm preconceitos. Bobos. Esqueceram que está todo mundo aí fora a fim de apontar nossos erros, de julgar nossas atitudes, de colocar o dedo no nosso nariz e gritar: culpado!

Se ofereceram para o sacrifício na maior boa-fé, achando que a sinceridade do gesto bastaria para que fossem compreendidos. Ninguém quer compreender ninguém, só se pensa em acusar. Hoje em dia, até mesmo crianças já aprenderam a trocar ingenuidade por autopreservação.

De certa forma, fiquei feliz de saber que ainda resta uma certa inocência no mundo. E que há mulheres, como as garotas da Gogo, que fogem à regra: duvido que sejam chatas.

Hoje quarta-feira é o Dia Internacional do sofá. Aproveite, namore e que tenhamos todos uma ótima quarta-feira.

domingo, 20 de julho de 2008


Diogo Mainardi

Eu sou a Britney Spears!

"O relatório da PF sobre a imprensa, apesar de grotesco, merece ser analisado por outro motivo: ele mostra claramente quem foi o inspirador do inquérito. Todos os jornalistas citados pisaram no pé de Luiz Gushiken e seu bando. Eu pisei. Um bocado"

Um relatório da PF me acusou de ser colaborador de Daniel Dantas. Quando li meu nome nas páginas policiais, pensei, tremulante e sem ar: – Amy Winehouse! Eu sou a Amy Winehouse!

Imagens assustadoras passaram por minha mente. Eu, embriagado e algemado, na porta de uma delegacia. Eu, num bar, aos tapas e pontapés. Eu, de sutiã, vagando pelas ruas da cidade.

Depois pensei, ainda mais angustiado: – Britney Spears! Eu sou a Britney Spears!

Me vi de cabeça raspada. Me vi fotografado, sem cuecas, descendo de um carro. Me vi perdendo a guarda de meus filhos.

A idéia de que sou um colaborador de Daniel Dantas é uma patetice. Basta ler os grampos da PF. Sabe o que há contra mim? Daniel Dantas e seus funcionários comentaram uma de minhas colunas e mandaram traduzir um documento que disponibilizei a todos os leitores na internet. Meu crime é ser lido.

O relatório da PF sobre a imprensa, apesar de seu caráter grotesco, merece ser analisado por outro motivo: ele mostra claramente quem foi o inspirador do inquérito, e qual era seu objetivo.

De um jeito ou de outro, todos os jornalistas citados pisaram no pé de Luiz Gushiken e seu bando. Eu pisei. Um bocado.

No comecinho de 2007, Luiz Gushiken até mandou a PF me investigar. Pisei no pé também de seus blogueiros de aluguel. E no do atual diretor da Abin, Paulo Lacerda.

E no de seu antecessor no cargo, Mauro Marcelo. E no de Luiz Roberto Demarco, denunciando a montanha de dinheiro que ele ganhou como lobista da Telecom Italia. Aliás, desconfio que o próprio Demarco tenha ajudado a fabricar o relatório sobre a imprensa.

É um acerto de contas com alguns de seus maiores desafetos, tanto profissionais quanto pessoais, como Guilherme Barros, da Folha de S.Paulo, cuja única culpa foi ter se casado com sua ex-mulher.

Por tudo isso, digo que o inquérito contra Daniel Dantas e Naji Nahas só pode ser interpretado da maneira mais elementar: foi a última cartada de Luiz Gushiken e seus palermas para tentar impedir a compra da Brasil Telecom pela Oi.

Há recados para todos os que participaram do negócio, até mesmo para Lula, por meio dos grampos em Gilberto Carvalho. A compra da Brasil Telecom pela Oi é realmente escandalosa. Espero que Luiz Gushiken consiga afundá-la.

Se dependesse apenas da PF, porém, os quadrilheiros sairiam impunes. Ainda bem que há juízes e procuradores para controlar todos os abusos. Eles podem separar direitinho o que é crime e o que não é.

Todo mundo aqui sabe que eu gosto de contar vantagem. É o que vou fazer agora. Quatro meses atrás, concluí um podcast para Veja.com da seguinte maneira:

"O plano da ala trotskista do PT, de Luiz Gushiken, era reestatizar a telefonia com dinheiro dos fundos de pensão e do BNDES.

Como sempre acontece com os trotskistas, eles bobearam e acabaram com um picador de gelo enterrado no cocuruto. A Oi está abocanhando a Brasil Telecom, mas seu comando será entregue aos grandes financiadores de Lula e de seus filhos, em sociedade com Daniel Dantas.

A ala trotskista do PT ainda pode tentar melar o jogo usando aquilo que lhe resta: um pedacinho da PF, outro pedacinho da Abin, outro pedacinho do Ministério Público.

Para quem está do lado de fora, é uma farra acompanhar a guerra entre os companheiros petistas. O Brasil está completamente rendido. Agora só o PT pode destruir o PT".

Já posso tirar o sutiã?

Ponto de vista: Lya Luft

A matança dos bebês

"Tantas famílias feridas, pais e mães arrasados, vidas desperdiçadas nesse vergonhoso lamaçal de omissão"

Herodes faria uma festa. Eu, que às vezes penso que nada mais vai me chocar, mal acredito no que se anuncia: morreram trinta e tantos bebês em certo hospital do norte do país. Já é horrível.

Logo depois, haviam morrido quase 100 e, finalmente, as autoridades admitiram bem mais de 200 mortos em alguns meses.

Bebês morriam como moscas no hospital que lhes devia propiciar a vida. Era caso de fechamento em todos os hospitais do mundo, mas uma autoridade local apenas disse, piscando os olhos como quem está um pouquinho insegura:

"Esse número de bebês mortos em hospital nessas condições é aceitável". Como tais condições perduraram mais de um dia? Eu estava ouvindo e lendo bem? Estava em meu juízo normal? Estava.

Pois então, viva Herodes. Porém, os caixõezinhos amontoados em uma pequena carreta e um pai muito jovem carregando mais um corpo, como se fosse o seu filhinho morto, não permitiam gracejo.

Ilustração Atômica Studio

Na cidade onde nasci havia duas igrejas: a católica e a luterana. Esta ficava perto de nossa casa: nela eu tinha sido batizada, como minha mãe e minha avó antes de mim.

Nela havia dois toques de sino para os mortos: o mais solene anunciava a morte de um adulto na comunidade. Quando era criança ou bebê, o sino tangia tristíssimo e delicado. O costume talvez não exista mais, porém eu não esqueci.

Minha avó murmurava: "Morreu uma criancinha. Será a de fulana, que andava tão doente? Será o bebê de sicrana, que nasceu fraco demais?".

Para os bebês agora mortos naquela UTI pediátrica de uma grande capital do norte do país não haveria nem sinos nem igrejas suficientes. Não sei a que número já chegou a mortandade, se o hospital continua funcionando, se alguém ainda diz que o número é "aceitável".

Como desculpa neste reino das desculpas, mencionaram-se vários fatores: ignorância das famílias, parcos recursos do hospital, falta de médicos, o de sempre. Seja como for, em algumas semanas morreram mais de 200 bebês. Iam-se anunciando as mortes, e parece que nada mudava, só morriam mais.

Tantas famílias feridas, pais e mães arrasados, vidas desperdiçadas nesse vergonhoso lamaçal de omissão. O mesmo que em tantos lugares deixa milhares de doentes serem atendidos em macas no corredor, sofrendo ou morrendo em salas de espera, ou no pátio do hospital – mais recente notícia.

Apesar disso o país funciona. Os carros rodam, os governos governam, os funcionários trabalham, pais e mães levantam cedo, dão café ou mamadeira aos filhos, entram em seus ônibus, vão para o trabalho, vão ao armazém – vão ao cemitério.

Os irmãos dos mortinhos chegam da escola, fazem seu dever de casa, vão dormir depois de jogar bola no pátio, que pode ser um quadradinho de barro com fezes e urina do esgoto a céu aberto.

E nós que lemos livros e jornais, que temos comida e saúde, fingimos que está tudo direito, que é assim mesmo, que somos quase um país de Primeiro Mundo, que a economia está ótima, o petróleo abunda, a Amazônia resiste, e nós estamos vivos.

Às vezes nos sentimos entediados, duvidamos de nossa eficiência, ficamos deprimidos: televisão, rádio e jornal não deviam mostrar certas coisas, tão triste tudo aquilo. Ou nos afligimos um pouco, tanta gente bandida vivendo feito rei, e tanta gente boa crucificada quando quer fazer o bem e consertar o mal.

"Ninguém controla a vida", me dizem, quando reclamo. Digo que, apesar das maravilhas da medicina, quando o hospital é limpo, o médico não está totalmente exausto, a enfermeira é bem treinada e os doentes em casa não vivem no esgoto ou no lixão, ninguém controla a morte.

A vida, ah, essa a gente devia controlar ao menos um pouco melhor.

Para que os sinos das cidades onde morrem centenas de bebês por inoperância e desinteresse não derretam de tanto bater o toque dos mortos inocentes, nossas vozes não se afoguem de dor no escuro dos quartos,

e nunca mais um adolescente derrotado tenha de levar no colo, à frente de uma carreta cheia de minúsculos caixões empilhados, o corpo de seu filhinho, que nós, todos nós, como sociedade, matamos.

Lya Luft é escritora

MÔNICA TARANTINO

Esperança para a tireóide

Estudo revela que o mineral selênio pode retardar e até evitar a tireoidite crônica, doença comum depois da gravidez



As doenças da tireóide estão aumentando. Duas em cada dez mulheres já passaram por exames para avaliar o ritmo de trabalho da glândula ou examinar nódulos.

E pelo menos uma delas se descobrirá portadora de tireoidite crônica, uma das alterações mais comuns. A doença ataca homens e mulheres, mas costuma se manifestar com mais freqüência durante e depois da gravidez, como mostrou um estudo da endocrinologista Maria Fernanda Barca, do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo.

Nestas situações, por motivos ainda desconhecidos, o sistema de defesa do organismo é levado a fabricar anticorpos para combater a própria glândula, como se ela fosse um órgão estranho. Atacada, ela se inflama e há uma queda na produção de hormônios.

É o que os especialistas chamam de tireoidite pós-parto, e que pode se tornar permanente em metade dos casos. Alguns dos seus principais sintomas são o cansaço, aumento do colesterol, depressão e alterações da pressão arterial.

O mais recente avanço nesse campo foi divulgado há um mês por um grupo de cientistas liderado pelo italiano Roberto Negro, durante o congresso da Sociedade Americana de Endocrinologia, em São Francisco, nos Estados Unidos. Negro provou que pequenas doses de selênio (200 microgramas), um potente antioxidante, podem retardar e até evitar a doença em algumas mulheres.

Das 2.143 gestantes que participaram do trabalho, 169 manifestaram sinais de que o organismo já tinha começado a fabricar os anticorpos contra a glândula. Desse grupo, uma parte recebeu doses do mineral e outra não. De acordo com o estudo, o uso do mineral durante 12 meses foi suficiente para diminuir em três vezes as chances de conviver com a doença depois do nascimento do bebê.

"O efeito se deve à capacidade do selênio de proteger a glândula da oxidação causada, em parte, pelo processo inflamatório", disse Negro à ISTOÉ. Cauteloso, ele afirma que o resultado da pesquisa não se aplica a todos os casos. "Mais estudos são necessários", diz.

As conclusões do estudo abrem uma nova perspectiva de prevenção, segundo a endocrinologista Fernanda Barca, da USP.

"Os bons resultados obtidos com selênio são a primeira boa notícia sobre tireoidite depois de mais de dez anos sem avanços", diz a especialista. Uma das pacientes que em breve começará a tomar doses do mineral junto com a reposição de hormônios tireoidianos é a administradora Amanda Freire, 25 anos, de São Paulo.

Ela descobriu que tinha problemas de tireóide porque não conseguia emagrecer e se sentia irritada. "Seguia a dieta, mas não conseguia perder quatro quilos. Foi então que meu namorado me sugeriu ir ao médico", diz Amanda, que faz reposição hormonal com comprimidos há um ano.

A possibilidade de usar selênio é uma gota de esperança em uma área que carece de recursos para controlar as formas mais resistentes da doença. Em alguns casos, ela evolui apesar do tratamento. Foi o que aconteceu com a enfermeira Cláudia Tomasso, que começou a sentir tonturas e taquicardia após o nascimento do segundo filho.

Cinco anos depois, as manifestações eram ainda mais intensas e foram detectados nódulos. "A médica me explicou que a tireoidite é um fator de risco para quem tem nódulos.

A doença aumenta o risco de eles se transformarem em câncer, o que ocorreu comigo. Por isso, fiz a cirurgia que remove a tireóide", conta.

A medicina tem estudado as razões da elevação do número de casos de tireoidite crônica.

Uma das explicações, para alguns especialistas, é a realização de mais exames. "Além dos endocrinologistas, os clínicos gerais e médicos como eu incluíram exames de tireóide na rotina das pacientes", diz Tânia Santana, coordenadora do Ambulatório de Sexualidade do Hospital Brigadeiro, em São Paulo.

A medida é aplaudida pelo endocrinologista Geraldo Medeiros, consultor do Ministério da Saúde e autoridade no assunto. "No Japão, os exames de tireóide já são obrigatórios durante a gravidez. Aqui deveriam ser também", diz ele.


20 de julho de 2008
N° 15668 - Martha Medeiros


O luxo de cara lavada

Gosto de moda, mas gosto ainda mais de atitude. Roupas bacanas a gente compra, basta dinheiro e informação. Mas atitude é outra coisa: é saber se destacar e inventar um novo estilo, deixar sua marca pessoal.

Garotas como Luiza Lovefoxxx e Amy Winehouse estão na vitrine do showbiz, lançam tendências para uma geração adolescente (ou com alma de adolescente) e exploram ao máximo o visual inusitado.

Mas escrevo sobre outro tipo de atitude: o da mulher que ousa, mas faz isso com elegância, sem apelar para um visual de circo.

Recentemente, uma loira e uma morena chamaram minha atenção por conseguirem fugir completamente do script sem perder a classe.

Uma foi a Xuxa, que foi a um casamento usando um lindíssimo e vaporoso vestido comprido e, por cima, em vez de uma echarpe, um xale ou qualquer obviedade para se proteger do frio, vestiu uma jaqueta jeans.

Se eu não tivesse visto a foto, se apenas tivesse ouvido falar a respeito, teria torcido o nariz e considerado um desrespeito aos noivos, que estavam dando uma festa chique e não promovendo uma rave.

Mas eu vi a foto. E gostei do que vi: Xuxa estava surpreendentemente adequada. O vestido, as jóias, a maquiagem, tudo conspirava pra fazer da jaquetinha jeans um acessório compatível com a ocasião.

E ao mesmo tempo que ela dava um toque moderno à produção, dava também um recado importante: o simples é sempre um artigo de luxo, desde que não seja usado como forma de agressão, de provocação, e sim para firmar uma personalidade.

No entanto, no quesito eu-sou-mais-eu, quem ficou com o cetro e a coroa foi a Miss Universo do ano passado, a japonesa Riyo Mori (aquela que tirou o primeiro lugar da nossa Natália Guimarães).

Domingo passado, durante a escolha da Miss Universo 2008, ela foi chamada para entrar no palco para seu desfile de despedida, e eu logo a imaginei vestindo um longo de paetês, portando colares e brincos de 200 toneladas e com aquela mão mole, abanando para seu passado.

Pois eis que entra uma mulher de calça comprida preta, fraque preto, rabo-de-cavalo e apenas um brilhantezinho minúsculo na orelha. Peraí. Calça comprida? Rabo-de-cavalo? Sem esmeraldas exuberantes?

Os concursos de miss, que eram um acontecimento décadas atrás, tiveram uma queda-livre em prestígio. Esse ostracismo durou até bem pouco tempo. Agora voltaram a despertar algum interesse, ainda que nem perto do que provoca um desfile de modas.

Houve uma certa agilização no formato e as misses, hoje, podem até mudar de cara se quiserem e mudam. Injetam e lipoaspiram tudo o que manda a cartilha para alcançar um padrão miss venezuela país que, não por acaso, levou o título esse ano, repetindo pela quinta vez o feito.

Ficam quase todas com o mesmo visual travesti-chic, a bordo de vestidos que nem a Sarah Jessica Parker se atreveria a usar e olha que Carrie segura qualquer exagero.

É aí que entra Ruyo Mori para fazer um desfile de despedida que mais parecia um desfile de abertura - de uma nova era. Surgiu para dar adeus ao seu reinado de miss usando calça comprida, e ainda assim esbanjando sofisticação e feminilidade. Foi a queima de sutiãs do mundo encantado das peruas.

Aplaudo quebras de protocolo feitas com categoria. Eu teria despachado a miss Venezuela pra casa e manteria a faixa com a japa.

sexta-feira, 18 de julho de 2008



18 de julho de 2008
N° 15666 - Liberato Vieira da Cunha


Da caixa de guardados

Há pessoas que colecionam amores, notas de cem, carimbos de passaporte. Eu há muito coleciono frases que gostaria de ter escrito.

Sobre a felicidade. "Felicidade é a certeza de que a nossa vida não está se passando inutilmente." (Erico Verissimo)

Sobre o passado. "É o futuro, usado." (Millôr Fernandes)

Sobre o futuro. "Tenho, às vezes, saudades do futuro." (Teixeira de Pascoaes)

Sobre a saudade. "Que me quereis, perpétuas saudades? Com que esperança ainda me enganais?" (Camões)

Sobre a paixão. "Nós só conhecemos as paixões dos outros, e o que chegamos a saber das nossas, é deles que pudemos saber." (Proust)

Sobre a sabedoria. "Deus conceda sabedoria aos que já a possuem e permita que os tolos se valham de seus talentos." (Shakespeare)

Sobre o tempo. "Perdido está todo o tempo que em amor não se gasta." (Tasso)

Sobre o amor. "Distante o meu amor, se me afigura / O amor como um patético tormento / Pensar nele é morrer de desventura / Não pensar é matar meu pensamento." (Vinícius de Moraes)

Sobre o pensamento. "Os pensamentos são tentações; são as que nos vêm de Deus; não propriamente que Deus nos mande; elas nascem da própria busca de Deus." (André Gide)

Sobre a solidão. "Nunca encontrei companhia mais sociável do que a solidão." (Thoreau)

Sobre a leitura. "Gosto de perder-me nas mentes de outras pessoas. Quando não estou caminhando, leio; não sei ficar sentado e pensar. Os livros pensam por mim." (Charles Lamb)

Sobre os livros. "Todos os livros se parecem por serem mais verdadeiros do que se tivessem acontecido realmente." (Hemingway)

Sobre a beleza. "A beleza é o acordo entre o sentido e a forma." (Ibsen)

Sobre a liberdade. "Liberdade, liberdade, / Abre as asas sobre nós." (Medeiros de Albuquerque).

Uma ótima sexta-feira e um excelente fim de semana.

quarta-feira, 16 de julho de 2008



16 de julho de 2008
N° 15664 - Martha Medeiros


Tive uma idéia!

Se você escutar alguém dizendo que teve uma idéia, pare tudo e ouça com atenção, mesmo que você suspeite que vá ouvir bobagem. Não importa. O que interessa é que você está diante de alguém que tem esperança, que leva fé em si mesmo, que acredita em alguma coisa. Não vale artista.

Artistas têm idéias por dever de ofício, por hábito vocacional, porque nasceram para ter idéias.

E o resto da população espera as que chegam prontas, as industrializadas, produzidas em série e divulgadas em revistas. Idéias para decorar seu lar com pouco dinheiro, idéias para renovar seu visual em 10 minutos, idéias para fazer um jantar de última hora apenas com o que você tem na geladeira.

Não. Estou falando sobre outro tipo de gente: daqueles raros que têm uma idéia que pode mudar uma vida.

Uma idéia como a que teve Beto, protagonista do filme O Banheiro do Papa, que vivia miseravelmente num povoadinho esquecido por Deus e que, na iminência da visita do representante maior do dito-cujo, pensou: vou dar outro final para minha história.

Teve uma idéia! Qual seja: muitos peregrinos viriam ver o Papa de perto, iriam passar o dia pelas ruas da cidadezinha, iriam rezar, comer, beber, e depois? Onde iriam fazer suas necessidades?

Eureca! Beto resolveu construir um banheiro público, ali, na frente da sua casa, e num único dia ganharia dinheiro suficiente para pavimentar o pátio, para pagar a conta atrasada de luz, para comprar uma moto e para mandar a filha estudar na capital.

Nós, na platéia, assistimos a tudo isso com o coração na mão, porque estamos diante de um sonhador, de um idealista, de um cara que cometeu a doidice de acreditar numa idéia sem antes encomendar uma pesquisa de opinião, fazer um planejamento estratégico, buscar um patrocinador e contratar um marqueteiro, que é como as idéias se viabilizam hoje.

Beto apenas teve a sua original idéia e colocou o plano em prática, sozinho, como se esperança bastasse para fazer as coisas darem certo.

Deveria bastar. Mas, infelizmente, aqui na terra dos céticos, nada é garantido, tudo é risco. E é isso que nos comove no entusiasmo de Beto.

Ele acha que não há risco e que não está sendo sonhador, ele tem uma convicção interna que é inquestionável: dará certo porque ele vai fazer dar certo. Alguém segura um sujeito desses?

Melhor perguntando: alguém conhece um sujeito desses?

Fazem falta os Betos, esses que têm idéias que ora parecem malandras, ora parecem ingênuas, mas que são levadas adiante com tanta garra, que não nos deixam outra saída a não ser torcer por eles, pois fazendo isso estamos torcendo também por nós e pela humanidade, que anda tão carente de otimismo.

Aproveite este Dia Internacional do sofá - Uma ótima quarta-feira para todos nós.

terça-feira, 15 de julho de 2008


ELIANE CANTANHÊDE

Desânimo

BRASÍLIA - Enquanto se discute se o foco é no corruptor (banqueiro, megaempresários...) ou no corrupto (agentes públicos variados);

se Celso Pitta deveria ou não ser exposto ao vivo e em cores metido em pijamas na própria casa; se pode ou não usar algemas em peixe graúdo...ninguém mais fala da Santa Casa de Misericórdia do Pará.

A medida de um Daniel Dantas, de um Naji Nahas ou de um Eike Batista é em bilhões de dólares, e a medida de uma tentativa de suborno de delegados está na bagatela de um milhão e pouco de reais.

Já a medida da Santa Casa de Misericórdia do Pará é em míseras centenas -centenas de bebês: 262 bebês morreram ali neste ano, foram enterrados e ninguém soube explicar por quê, nem alguém mais quer saber exatamente o que ocorreu.

Bilhões de dólares saem pelo ralo, seja da corrupção, seja da mera ganância patológica, e faltam migalhas para salvar bebês, mães e famílias, não só da morte como do abandono e do desalento. Morrem seis bebês, é coisa comum.

Morrem 20, dão de ombro. Morrem 100 e não se acende uma luz amarela. São necessários 262 mártires para a maternidade acordar, o Estado acordar, o país acordar?

O debate nacional escorrega do possível corruptor para um leque infernal de supostos corruptos. Um deputado daqui, um advogado de lá, um juiz daqui, um assessor palaciano de lá e, quanto mais aumenta a rede, menos chance de se pegar o(s) peixe(s) graúdo(s).

No oceano de acusações cruzadas, de reputações periclitantes, ninguém ouve mais falar dos bebês, nem se horroriza mais com suas covinhas, uma atrás da outra, fantasmagóricas e conformadas. E ainda se fala, e se chora, hoje a morte do menino João Roberto no Rio.

Mas só até a próxima bala policial perdida, a próxima vítima indefesa, a próxima família destroçada. Bem-vindo, Salvatore Cacciola! Sinta-se em casa.

elianec@uol.com.br

Bem e não estamos falando de 262 gatinhos...nem cachorrinhos...mas de 262 bebês que poderiam tornar-se cidadãos honrados desse País se lhes deixassem..

sábado, 12 de julho de 2008



13 de julho de 2008 | N° 15661
Martha Medeiros


O que o bafômetro não sabe

Nessa caça às bruxas que virou o caso dos motoristas embriagados, divulgou-se que as mulheres praticamente estão fora de perigo: por beberem menos, ou por serem mais obedientes à lei, parece que só uma, em todo o Estado, foi presa até agora.

As mulheres bebem, e não é chazinho, mas temos a cabeça no lugar e não vamos nos arriscar.

Álcool nunca foi motivo para cometermos barbaridades no trânsito. Quanto a isso, a Polícia Rodoviária pode ficar tranqüila. Agora, se virem uma mulher dirigindo em estado de profunda dor-de-cotovelo, detenham-na.

Eu tenho umas teorias estapafúrdias e essa é mais uma. Estou divulgando-a aqui na coluna para, dependendo do recall das leitoras, confirmar se ela é estapafúrdia mesmo ou se há nela alguma legitimidade. Trata-se do seguinte: o amor é que é nossa cachaça.

Tenho três exemplos pra contar, todos reais.

1. Eu a conhecia bem. Ela não havia bebido, eram 10 horas da manhã. Seu único problema é que estava embriagada de desgosto. Abissalmente triste.

Garoava, um carro travou em frente ao dela e não houve tempo para frear: quando viu, já havia colidido. A cabeça estava em outro mundo, menos no trânsito. Chorou ali mesmo, no meio da rua. Chorou tudo o que estava represando há dias. Álibi perfeito.

2. Uma outra saiu muito irritada do prédio do namorado. Mas muito irritada. Eu a entendo. Homens têm essa capacidade congênita de tirar a gente do sério.

Pois então: a louca saiu da garagem dele sem nem esperar o portão eletrônico abrir totalmente. Raspou todo o teto do carro e a antena ainda ficou de presente pra ele, torta, ali no chão.

Ela nem se deu o trabalho de sair do carro e buscá-la, seguiu em frente cantando pneu. Foi a partilha de bens do casal. Ele ficou com a antena, e ela com um baita arranhão no carro e um machucado maior ainda por dentro.

3. A última. Havíamos nos encontrado por acaso na rua, sentamos para tomar um suco e ela me contou que não suportava mais uma determinada situação.

Estava com ódio de si mesma por não conseguir dar fim ao seu tormento. Quando nos despedimos, perguntei se ela estava em condições de dirigir. Imagina! Estava na fossa, só isso.

Ela me abraçou e prometeu dar notícias. E deu. Me contou que naquele mesmo dia, logo depois de nos despedirmos, ela fez uma ultrapassagem, digamos, mais dinâmica, e provocou um batidazinha. Coisa boba, mínima. "Mas eu não precisava mais essa".

Nenhuma lei vai nos pegar, já que felizmente não existe o teste do "fossômetro", mas mulheres que acabaram de ter uma séria discussão com o namorado ou o marido, não abusem. Melhor pegar um táxi.

Não está provado por nenhuma estatística, mas um coração agredido também altera nossa conduta, também diminui nossos reflexos, também pode comprometer nossa perícia no trânsito. Ou seja, uma paixão mal correspondida é que nos torna perigosas.

Diogo Mainardi

Nassif, o banana

"Luis Nassif foi demitido da Folha pela suspeita de ter usado seus artigos no jornal para achacar o governo de Geraldo Alckmin. Falei sobre o episódio com o diretor da Folha. Ele confirmou. Com a carreira arruinada, Luis Nassif refugiou-se na internet, como Mengele em Bertioga"

Eu sou lobista de Daniel Dantas. É o que diz o blogueiro Luis Nassif. Como foi que eu ajudei Daniel Dantas? Acusando-o de ter financiado Lula.

E também acusando Naji Nahas de ter financiado Lula. O fato de eu ter publicado uma série de documentos judiciais sobre Naji Nahas e a Telecom Italia me incrimina, segundo Luis Nassif.

Entende-se: em meu lugar, ele teria picotado e obedientemente engolido esses documentos, que denunciam as ilegalidades cometidas pela empresa e pelo governo. Quem patrocina o site de Luis Nassif? A Telecom Italia. Quem impediu que ele falisse e perdesse até as cuecas? O BNDES.

Eu já ridicularizei Luis Nassif três anos atrás, demonstrando que ele reproduziu integralmente em sua coluna a nota de um lobista ligado a Luiz Gushiken.

Ele foi demitido da Folha de S.Paulo pouco tempo depois, por causa de um fato ainda mais nauseabundo: a suspeita de ter usado seus artigos no jornal para achacar o governo de Geraldo Alckmin. Em 2004, Luis Nassif convidou o secretário Saulo de Castro para um fórum de debates organizado por sua empresa, Dinheiro Vivo.

O detalhe sórdido era o seguinte: para o secretário poder participar do evento, o governo paulista teria de desembolsar 50.000 reais. Saulo de Castro negou o pedido.

Em 2005, Luis Nassif voltou à carga, cobrando uma tarifa ligeiramente mais modesta, de 35.000 reais. A assessora de Saulo de Castro mandou um e-mail para o chefe com este comentário: "Não é à toa que a empresa se chama Dinheiro Vivo". Saulo de Castro negou o pedido mais uma vez. Luis Nassif decidiu retaliar.

Em sua coluna, passou a atacar sistematicamente o governo Alckmin, em particular o secretário Saulo de Castro. Quando o diretor da Folha de S.Paulo, Otavio Frias Filho, foi informado das suspeitas em torno de Luis Nassif, demitiu-o imediatamente. Nesta semana, falei sobre o episódio com Otavio Frias Filho. Ele confirmou.

Com a carreira no jornalismo arruinada, Luis Nassif refugiou-se na internet, onde seu passado era desconhecido, como o de Mengele em Bertioga. O bando de Luiz Gushiken arranjou-lhe uma sinecura no iG.

Enquanto fazia um blog para meia dúzia de leitores, ele era obrigado a escapar de seus credores no BNDES, que queriam penhorar seus carros e apartamentos para tentar recuperar uma parte do rombo de 4 milhões de reais da Dinheiro Vivo.

No fim de 2007, depois de um misterioso encontro com a diretoria do BNDES, ele conseguiu fechar um acordo judicial altamente lesivo para o banco, que lhe garantiu os seguintes mimos: o abatimento de 1 milhão de reais de sua dívida, o prazo de dez anos para saldá-la, a retirada de todas as garantias para o pagamento do empréstimo e a dispensa de uma multa de 300.000 reais.

Algumas semanas depois, ele retribuiu a generosidade estatal usando o único método que conhece: uma campanha de mentiras descaradas contra mim e contra VEJA, tidos como inimigos do governo.

Luis Nassif é um banana. Ninguém dá bola para ele. Por isso mesmo, minha idéia era persegui-lo apenas judicialmente. De fato, estou processando o iG.

Tenho uma tonelada de mensagens, documentos e testemunhas que desmoralizam toda a imundície publicada em seu blog. Mas suas calúnias ganharam outro peso depois que Daniel Dantas e Naji Nahas foram presos.

Claramente, o pessoal que o emprega está preocupado com o rumo que esse inquérito pode tomar. Há um empenho para impedir que os dois sejam associados a Lula, como eu sempre fiz.

Quando Daniel Dantas e Naji Nahas foram presos, eu comemorei. Luis Nassif deve ter pensado em todos os documentos que terá de picotar e engolir. E em todos os patrocinadores que poderá ganhar.

Ponto de vista: Stephen Kanitz

Por que sexo é tão divertido

"Sexo precisa ser divertido, mas o segredo do divertimento são o comedimento, a surpresa e o mistério, e não essa massificação e banalização a que estão nos submetendo"

Por que os homens só pensam "naquilo"? Por que nossas novelas só mostram "aquilo"? Por que nossos anúncios e propagandas insinuam "aquilo", sem parar? Porque fomos geneticamente programados a pensar "naquilo" com muita freqüência.

Podemos esquecer de fazer uma série de coisas na vida. Podemos nos esquecer de tomar café ou de dizer bom-dia ao vizinho, mas de uma coisa jamais podemos nos esquecer: de nos reproduzir e ter filhos.

Cada um de nós está vivo porque somos o último elo de milhões de antepassados, nenhum dos quais se esqueceu de reproduzir-se. Quando as mulheres reclamam que homens só pensam "naquilo", elas estão sendo tremendamente injustas porque o instinto do "não esquecimento" está em ambos os sexos, e com a mesma intensidade.

Afinal, nenhuma das mulheres que fazem parte da nossa genealogia se esqueceu de reproduzir-se. Hoje se suspeita até que mais mulheres traiam o marido do que vice-versa.

Coloque-se na posição de Deus no dia da criação. Você tem de decidir que tipo de ser humano criar. Você precisará definir a intensidade de qualidades como agilidade, inteligência, força, solidariedade e que grau de instinto sexual atribuir ao homem e à mulher. Como a energia é escassa, você não poderá dar grau 100 a cada qualidade humana.

Você daria 100 à inteligência, 60 à agilidade e 40 ao instinto sexual? Ou você daria 40 à inteligência, 60 à agilidade e 100 a nosso interesse "naquilo"?

Você preferiria criar um ser humano inteligente, mas desligado, ou um ser humano mais bobão, mas com pouco risco de ser levado à extinção? Foi por essa segunda opção que Ele parece ter se decidido: criou um ser humano bobo, mas que vive pensando "naquilo".

Ilustração Atômica Studio

Pela lei da probabilidade, entre nossos 4 milhões de ancestrais, mais de uma vez tivemos um antepassado meio esquecido e desligado, que só teve um filho aos 36 anos, pouco antes de ser comido pelos leões.

O suficiente para ele deixar você como descendente. Todos nós escapamos por um triz de não estar lendo este artigo. Se Deus tivesse atribuído grau 40 em vez de 100, o que provavelmente muitos teólogos, papas e moralistas teriam escolhido, a sua história familiar seria outra, ou seja, inexistente.

Essa decisão divina explica muita coisa deste mundo maluco: esta burrice coletiva que assola o mundo e o Brasil e as besteiras que homens e mulheres cometem.

Uma sábia decisão que hoje provoca uma série de problemas, como o erotismo desenfreado, a preocupação exagerada com o sexo, o desempenho e a traição, que trazem como conseqüência esta sociedade de consumo e de ostentação. Mas que nos permitiu chegar até aqui como somos: lerdos, burros, mas vivos.

A encrenca é que a maioria dos nossos publicitários, autores de telenovela, artistas, cineastas, a turma do "trair é normal" e do "tudo é permitido", usa e abusa desse nosso instinto supercaprichado para os próprios interesses.

Um jovem hoje em dia terá sido exposto a 12.000 apelos sexuais antes de completar 14 anos, uma aberração cultural sem precedentes na história da humanidade.

Hoje não precisamos ter doze filhos baseados na chance de que dois chegarão até a vida adulta. Estão deliberadamente abusando desse nosso gene de preservação para ganhar dinheiro para suas empresas e para si.

Se você acha divertido assistir a novelas que só tratam "daquilo", se você vive na internet procurando "aquilo", se você acha o máximo os livros que só tratam "daquilo", saiba que você está sendo usado e correndo risco de extinção.

Estão afastando-o de sua verdadeira tarefa de procurar alguém ideal para fazer "aquilo" com amor e diversão. Estão usando o instinto mais caprichado que Deus nos deu para fazer justamente o contrário, deixar você isolado na frente do computador ou da televisão.

Nossos professores, artistas e cineastas, nossos líderes espirituais, nossa Igreja, nossos intelectuais estão se esquecendo de que sexo precisa ser de fato divertido, mas o segredo do divertimento são o comedimento, a surpresa e o mistério, e não essa massificação e banalização a que estão nos submetendo.

Stephen Kanitz é administrador (www.kanitz.com.br)

SUZANE FRUTUOSO

Os fiéis do sexo

Cada vez mais segmentadas, igrejas evangélicas se voltam para a conversão e o acolhimento de atores pornôs e prostitutas

TENTAÇÃO O pastor Ferreira, ex-ator de filmes pornôs

As religiões pregam que todo ser humano deve ser acolhido por uma igreja, independentemente do "pecado" que carregue. Mas para que o fiel se sinta à vontade para bater às portas de um templo, elas vão ficando cada vez mais segmentadas, formando tribos com perfis parecidos.

Atualmente, estão em expansão as denominações evangélicas que se identificam com a questão sexual. Elas abrigam atores pornôs, prostitutas, homossexuais e travestis, entre outros. Nesses templos, a conversão é desejável, não obrigatória. Importante é se aproximar de Deus.

O conceito faz parte do discurso do pastor Giuliano Ferreira, 29 anos. Ele comanda desde 2005 a Assembléia de Deus Ministério de Madureira, em Ribeirão Bonito, interior de São Paulo.

As pessoas que freqüentam o lugar se sentem confortadas pela história de salvação do religioso. Há quatro anos, ele ainda era conhecido como Juliano Ferraz, um dos mais atuantes atores pornôs brasileiros, com cerca de 300 filmes nacionais e internacionais.

Giuliano entrou para a indústria pornô em 1999. Com o ofício, conseguiu comprar três casas e ajudar a família. "Mas a angústia crescia junto com a prosperidade financeira", afirma. Largou tudo quando alguns colegas contraíram o vírus da Aids. "Era um sinal para eu parar.

" O pastor diz que não proíbe ninguém de participar de seus cultos por causa de escolhas pessoais. "Sei que minha história fortemente ligada ao sexo atrai, por exemplo, prostitutas. Elas se identificam com meu passado e acham que também podem mudar de vida. Mas não forço nada nem as recrimino", diz.

As igrejas que acolhem profissionais do sexo despontaram em Michigan, nos Estados Unidos, há cinco anos. Lá, um grupo de jovens pastores criou a XXX Church - as três letras "x" fazem um som parecido com a palavra sex.

O alvo é a indústria de filmes pornôs. Empunhando a Bíblia, os pastores pornôs, como se auto-intitulam, invadem os sets de filmagem, na tentativa de tirar alguns atores da carreira. Mas, explicam, recebem da mesma forma aqueles que não desistem da profissão.

SALVAÇÃO Atrizes da indústria pornô americana seguram camisetas nas quais se lê "Jesus ama astros pornôs". A idéia já chegou ao Brasil


Em feiras eróticas, pregam e vendem camisetas em que se lê "Jesus ama astros pornôs". O site xxxchurch.com recebeu no último mês um milhão de visitas. Em janeiro de 2009, a igreja inaugurará o templo oficial, em Las Vegas.

No Brasil, a igreja Projeto 242, em São Paulo, se inspirou no exemplo americano para criar o site Sexxx Church, que existe há nove meses.

Ainda não há diálogo com a indústria pornô, conta Jota Mossad, responsável pela página. Houve contato com a produtora Brasileirinhas, mas ninguém retornou.

O objetivo é converter? "A idéia é criar uma amizade, não apontar o dedo e dizer 'o que você faz é errado'. Mas mostrar que a pornografia alimenta a indústria da exploração sexual", afirma.

O nome 242 vem de uma passagem do Novo Testamento, no livro Ato dos Apóstolos, capítulo 2, versículo 42 ("E perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações").

"A mensagem desse trecho da Bíblia mostra que Jesus e os apóstolos creram num espírito comunitário.

É a nossa filosofia", diz o pastor Sandro Baggio. Entre os planos da igreja está a venda de uma camiseta nos mesmos moldes da americana na Erótica Fair, feira programada para outubro, em São Paulo.

Com o dinheiro arrecadado, será dado início à produção de um Novo Testamento. Na capa, a sugestiva mensagem "Jesus ama
Todos"


12 de julho de 2008
N° 15660 - Nilson Souza


Boas notícias

Às vezes, parece mesmo que os políticos são todos iguais. Na Romênia, os senadores aprovaram na semana passada uma lei que obriga as estações de rádio e televisão do país a divulgar notícias positivas e negativas em igual proporção.

O autor do projeto disse que seu objetivo é melhorar o clima geral e oferecer ao público a oportunidade de ter uma visão equilibrada da vida cotidiana. Se os fatos mostrarem o contrário, como dizia Nelson Rodrigues, pior para os fatos.

Além da interferência indevida no direito dos cidadãos de conhecer a verdade inteira, por pior que ela seja, os parlamentares do país do Drácula largaram um pepino nas mãos dos jornalistas: encontrar notícias boas em número suficiente para promover o desejado equilíbrio.

Comecemos pela definição mais clássica de notícia, feita por um jornalista americano no início do século 19: "Quando um cachorro morde uma pessoa, isto não é notícia. Mas quando uma pessoa morde um cachorro, isto é notícia". Neste caso, na visão dos senhores parlamentares, tanto a notícia quanto a não-notícia entrariam no lado negativo.

Como contrabalançar? Jornalista não inventa notícia. Pelo menos, não deveria. E as pessoas não querem saber apenas dos acontecimentos normais. Querem conhecer o diferente, o inusitado, o surpreendente.

E fatos positivos com tais ingredientes são raros. Não acho que seja apenas por morbidez que o público consome noticiário sobre tragédias e escândalos. É, muito mais, porque tais fatos mexem com a imaginação e com as emoções das pessoas.

Jornais só com boas notícias já foram tentados muitas vezes, mas sempre acabaram na pior notícia para eles: a falência.

O poeta Affonso Romano de SantAnna, que esteve recentemente por aqui para participar do Fronteiras do Pensamento, conta que na década de 60, quando trabalhava no Diário de Minas, ele e seus colegas de Redação resolveram fazer uma brincadeira de 1º de abril.

Reproduziram a primeira página do jornal na capa do segundo caderno, com desenho igual, mas apenas com boas notícias, todas inventadas:

Descoberta a cura do câncer, Valeriodoce (time mineiro) ganha o Mundial de Clubes etc. Alguns leitores acharam graça, mas vários outros ficaram muito decepcionados quando se deram conta de que tudo não passava de um bem-humorado logro.

As pessoas não gostam de ser enganadas, nem de brincadeira.

Por isso, o melhor e o mais honesto é retratar a realidade exatamente como ela é. Sem disfarces nem imposições. Ao contrário do que pensam os políticos romenos, a tentativa de interferir na vida das pessoas com um decreto autoritário não é uma notícia boa.

sexta-feira, 11 de julho de 2008



11 de julho de 2008
N° 15659 - Liberato Vieira da Cunha


Uma garota na neblina

É raro ver desfilando em meio à paisagem gris de inverno um instante de pura beleza.

Foi o que me aconteceu no último sábado na que é talvez a mais larga avenida de Porto Alegre. O sinal fechou e os carros pararam comportados para assistir à passagem de uma única pedestre.

Era uma garota de uns 20 anos, meio surreal em sua travessia. Vestia roupas coloridas que contrastavam com o cinza da manhã. Puxava uma dessas pequenas malas dotadas de rodas que se vê muito nos aeroportos. Não tinha pressa.

Cruzou descansada as quatro pistas que se projetavam à minha frente e, quando transpôs o canteiro que separava as pistas opostas, incendiou-se de luz. Uma ponta de sol havia rompido a cerração e pousado nela, revestindo-a de uma extraordinária lindeza.

Quase perdi a respiração ao vê-la assim tão bela, atravessando, perfeita e descuidada, o outro trecho da perimetral. E iluminada seguiu rumo à calçada, que foi quando a perdi. O sinal havia aberto e os carros arrancavam, apressados.

Quem não arrancou fui eu. Isto é, meu carro moveu-se, tomou outras ruas, dobrou esquinas, subiu ladeiras, parou em sinais, mas dentro de mim persistia intacta a claridade da menina em toda a sua formosura.

Percebo que usei a palavra formosura, que soa antiquada como uma serenata antiga, mas não encontro outra para descrever o que presenciei. Aquela garota encantou meu dia e me fez prisioneiro de perguntas sem resposta.

De onde vinha? De uma primeira noite de amor com seu enamorado? Para onde ia? Pegar um avião vermelho que a alçasse sobre as nuvens, lá onde tudo é azul?

O que a tornava tão linda, a ponto de convocar o sol para dentro das névoas de julho? A magia de sua formosura?

Nunca saberei. Sei no entanto o bastante: por um momento desceu a primavera sobre este inverno.

Ótima sexta-feira e um excelente fim de semana

quinta-feira, 10 de julho de 2008





Relato de uma Professora:

Semana passada comprei um produto que custou R$ 1,58. Dei à balconista R$ 2,00 e peguei na minha bolsa 8 centavos, para evitar receber ainda mais moedas. A balconista pegou o dinheiro e ficou olhando para a máquina registradora, aparentemente sem saber o que fazer.

Tentei explicar que ela tinha que me dar 50 centavos de troco, mas ela não se convenceu e chamou o gerente para ajudá-la. Ficou com lágrimas nos olhos enquanto o gerente tentava explicar e ela aparentemente continuava sem entender. Por que estou contando isso?

Porque me dei conta da evolução do ensino de matemática desde 1950, que foi assim:

1. Ensino de matemática em 1950:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é igual a 4/5 do preço de venda .
Qual é o lucro?

2. Ensino de matemática em 1970:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é igual a 4/5 do preço de venda ou R$ 80,00.
Qual é o lucro?

3. Ensino de matemática em 1980:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é R$ 80,00. Qual é o lucro?

4. Ensino de matemática em 1990:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é R$ 80,00. Escolha a resposta certa, que
indica o lucro:
( )R$ 20,00 ( )R$40,00 ( )R$60,00 ( )R$80,00 ( )R$100,00

5. Ensino de matemática em 2000:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$ 100,00. O custo de
produção desse carro de lenha é R$ 80,00. O lucro é de R$ 20,00.
Está certo?
( )SIM ( ) NÃO

6. Ensino de matemática em 2007:
Um cortador de lenha vende um carro de lenha por R$100,00. O custo de
produção é R$ 80,00. Se você souber ler coloque um X no R$ 20,00.
( )R$ 20,00 ( )R$40,00 ( )R$60,00 ( )R$80,00 ( )R$100,00

Recebido da minha amiga Tania Lyra, que aliás sempre encaminha umas preciosidades - Uma ótima quinta feira para todos nós

quarta-feira, 9 de julho de 2008



09 de julho de 2008
N° 15657 - Martha Medeiros


Sobre alguns beijos

Já deve ter acontecido com você também. É o seguinte: você se considera uma pessoa de cabeça aberta, até que um fato qualquer lhe causa algum desconforto e você não entende: ué, o que está havendo comigo?

Pois aconteceu quando vi a foto da Daniela Mercury beijando uma outra cantora que eu não conhecia, Alline Rosa. O beijo aconteceu durante a gravação de um DVD da banda Cheiro de Amor, em que elas dividiram o palco.

Quando terminaram de cantar uma música juntas, Daniela se ajoelhou em frente a sua anfitriã e em seguida se levantou e tascou-lhe um beijão na boca.

Grande novidade. Muito antes disso, Madonna e Britney Spears fizeram o mesmo, e desde então só vem aumentando a troca de bitocas em público, para deleite dos fotógrafos.

Luiza Brunet com Adriane Galisteu, Adriane Galisteu com Hebe, Hebe com Gil, Gil com Lulu Santos, Lulu Santos com não-sei-quem, e daí? Vou ficar chocadinha agora?

Nunca dei a mínima. Mas o beijo da Daniela Mercury me surpreendeu, e eu fiquei surpreendida por ter me surpreendido. Um momento de entusiasmo sob os holofotes, uma performance corriqueira, um beijo a mais no showbiz, qual a diferença?

Preconceito contra a homossexualidade não era, já cansei de defender o respeito à diversidade sexual, e essa questão nem entrou em pauta, era só uma cena para os flashes, uma brincadeira, nada mais. O que me incomodou, então?

Me incomodou o fato de que eu estou me transformando numa caretona, só pode ser isso. Eu tinha uma idéia de que a Daniela Mercury era uma mulher imune à propagação de factóides.

Sempre admirei pessoas que se preservam, que não se expõem desnecessariamente, que mantém um certo mistério. Santa nostalgia. Isso já não existe.

Há muito que trocamos o sensacional pelo sensacionalismo. Amanhã o João Gilberto poderá dar um beijo na boca do Chico Buarque e isso só provará que o mundo está mais alegre e desestressado. E que eu parei no tempo.

Ainda sobre beijo, agora sob outro aspecto. A Argentina é um país de homens viris. Uma demonstração clara disso é que lá os homens se cumprimentam com um beijo no rosto.

Parentes e amigos se beijam a cada vez que se encontram na rua ou num bar. Eu acho uma imagem bonita de se ver.

Aqui no Brasil esse hábito ainda está engatinhando, mas quando vejo pai e filho se beijando, ou um amigo beijando outro, automaticamente penso: é um homem de classe. Não sei se isso me redime da caretice ou se agora não adianta mais, já sou um caso perdido.

sábado, 5 de julho de 2008



06 de julho de 2008
N° 15654 - Martha Medeiros


Quando menos se espera

Algumas revistas, de vez em quando, resolvem dar uma facilitada para seus leitores e publicam matérias revelando qual é o melhor lugar para paquerar, assim como o melhor horário e os melhores alvos. "Onde, quando e quem", tudo de mão beijada para quem está à procura de um amor.

Não custa fazer o teste. Vá até o bar sugerido, na hora em que estiver mais lotado, e selecione seu objetivo conforme orientação da revista: alguém com determinada idade, modo de vestir, jeito de segurar o copo, tudo como foi indicado. Encontrou?

Agora espere o garçom acordá-la e avisar que o bar está fechando, baby. Você pegou no sono e não aconteceu na-da.

Não estou fazendo pouco da sua solidão, eu bem que estava torcendo por você, mas a maldita experiência ensina: quando a ansiedade é grande, as chances são mínimas.

Portanto, dê um tempo para as dicas dos outros e arrisque seguir as minhas. Pois é, eu também sei palpitar sobre o "onde, quando e quem". Principalmente quando estou sem assunto.

Onde menos se espera. É esse o lugar. Não é preciso fornecer endereço, bairro, CEP, até porque você não tem que ir a lugar algum.

Onde menos se espera pode ser exatamente aí onde você está. Na fila do banco, numa farmácia, dentro da igreja, na ante-sala de um consultório, numa reunião de condomínio, na parada de ônibus, numa clínica veterinária, até mesmo dentro da sua própria casa. Juro, o amor pode bater à porta, conheço casos.

Por exemplo, você está esperando um eletricista e, de repente, o eletricista vem acompanhado do arquiteto responsável pela obra. Blim-blom, e seu destino está traçado. O que nos leva ao parágrafo seguinte.

Quando menos se espera. É este o melhor horário. Mas há riscos. Digamos que o arquiteto bateu à porta quando você havia se programado para passar o dia trabalhando em casa, e, portanto, estava parecendo um molambo. Sabe o que é um molambo? Um pedaço de pano velho.

Você escolheu pra vestir a coisa mais medonha e surrada que encontrou no armário e deixou para lavar o cabelo só no dia seguinte, quando pretendia ir a um bar procurar um amor e aquela coisa toda.

A gente nunca sabe quando vai ser nosso dia de sorte, mas pode ter certeza de que ele não será anunciado com antecedência.

Por isso, é bom estar sempre arrumadinha, mesmo que seja para descer até à garagem do prédio para buscar o celular que você esqueceu dentro do carro. Sabe como é, entre o seu apartamento e a garagem existe algo chamado elevador. Humm.

Por fim, quem! Quem menos se espera. Você fica de olho no dono da festa, mas é o pai dele - mais charmoso que o filho, aliás - que vem perguntar se você usa o MSN. Você encasqueta de querer ser mulher de jogador de futebol e cai um professor de literatura na sua rede.

Você cumprimenta, toda alegrinha, o sujeito que cruza diariamente com você nas suas caminhadas de sábado, mas é o cara barrigudinho que lava o carro ali por perto que costuma avaliá-la com olhos mais atentos. Pode não ser animador, mas assim é a vida: você mira no plano A, mas é sempre o plano B que vinga.

Conclusão? Deixe de ser óbvia e tire os olhos do arquiteto. O eletricista é que é um homão, trabalha no que gosta, lê nas horas de folga, está solteiro e com a agenda lotada - ou você ainda não confia na ascensão dos prestadores de serviço?

O arquiteto está matando cachorro a grito e ainda vai te pedir um troco pro ônibus.

Diogo Mainardi

O país do Zé Pretinho

"O lulismo se especializou em surrupiar as glórias nacionais. Agora está tentando surrupiar a principal delas: o nosso longo histórico de alegre e sincera subalternidade.

É bom lembrar: nós já éramos obstinadamente servis antes de Lula, e permaneceremos assim depois dele" Lula - ?

É isso que consta na lista de pagamentos do empreiteiro Zuleido Veras, dono da Gautama, preso no ano passado. O nome de Roseana Sarney, que também faz parte da lista, é seguido por um número: 200 000. O nome do tio de Roseana, o "Gaguinho", é seguido por outro número, bem mais modesto: 30 000. E Lula?

Lula, no momento em que a lista foi feita, no começo da última campanha eleitoral, ainda era um ponto a ser respondido. Um ponto particularmente importante, sublinhado.

Ninguém sabe se Lula acabou recebendo algum número da Gautama. Pior: ninguém se interessou em saber.

Duas semanas atrás, VEJA reproduziu a lista de pagamentos do empreiteiro, que está em poder da PF, contendo o nome de Lula. O resto da imprensa ignorou o assunto. O Congresso Nacional ignorou o assunto. Os leitores ignoraram o assunto.

A idéia de que é perfeitamente inútil continuar a denunciar Lula se alastrou por aí. Leio uns dez blogueiros amargurados por dia dizendo que ele é imune a tudo.

Que o Brasil está rendido. Que está entorpecido. Que está em coma. Na falta de outros argumentos, esse acabou se transformando também no maior fator de orgulho para os lulistas.

Eles sempre se gabam do fato de Lula conseguir manter-se imensamente popular a despeito de todas as ilegalidades de que é acusado. Mas esse é um grande embuste. E eu me recuso a aceitá-lo.

O lulismo se especializou em surrupiar as glórias nacionais. Agora está tentando surrupiar a principal delas: o nosso longo histórico de alegre e sincera subalternidade.

É bom lembrar: nós já éramos obstinadamente servis antes de Lula, e permaneceremos assim depois dele.

Quem Lula pensa que é? Em 1937, Getúlio Vargas deu seu golpe de estado. Poucos meses depois, os sambistas se acotovelavam para determinar quem conseguia lamber as botas do ditador de maneira mais degradante:

Surgiu Getúlio Vargas,
O presidente brasileiro,
Que entre seus filhos
Como um herói foi o primeiro.

Essa marchinha foi composta por Zé Pretinho. Encontrei-a na página da internet do ministro da Propaganda de Lula, Franklin Martins, um dos maiores estudiosos do nosso cancioneiro político.

É muito apropriado que, nestes últimos anos, Franklin Martins tenha se tornado um símbolo do adesismo da imprensa lulista, um Zé Pretinho do jornalismo.

Recomendo uma atenta consulta à sua página. Há desde a ode à Petrobras ("Brasil, meu Brasil / Vais crescer ainda mais / Com a Petrobras") até a embolada em defesa da prática do nepotismo ("O meu irmão / Pru sê um moço de talento / Punha no Saninhamento"), que deve ser especialmente estimada por Franklin Martins.

Quando algum lulista vier importuná-lo ostentando a popularidade de Lula, pegue o bandolim e entoe o sambinha getulista:

Brasil, meu Brasil de verde mar,
Gigante que desperta de um sono secular.
Brasil, orgulho do brasileiro,
Tens no leme do teu barco
Um herói por timoneiro.

Ponto de vista: Lya Luft

Três destinos femininos

"Neste país, a fronteira entre justo e injusto, verdadeiro e falso, correto e maldoso precisa ser urgentemente restabelecida"

Ayaan Hirsi Ali, uma jovem política e escritora somaliana, naturalizada holandesa e residente nos Estados Unidos, disse numa palestra que "as verdadeiras fronteiras são as do pensamento". Referia-se a toda sorte de discriminação e preconceito que tanta violência e desgraça geram.

Vitimada desde criança por um fanatismo brutal, destinada a casar com um homem que não conhecia, conseguiu fugir e acabou uma figura admirada no mundo inteiro. Jurada de morte por certos grupos muçulmanos em seu país de origem, ela só pode circular com forte segurança.

Olhei aquela quase-menina tranqüila, mas de olhar profundo e muito atento. Pensei no quanto, por qualquer bobagem, nos fazemos de vítimas, enquanto aquela jovem não apenas sobrevive, mas age e se afirma: sem desejo de vingança e sem o detestável espírito de mártir, que produz o ressentimento mais maligno.

Acabo de emprestar minha voz para o documentário sobre outro fato espantoso, o das Noivas do Cordeiro. Um vilarejo com esse nome, perto de Belo Horizonte, é habitado por algumas famílias – mais mulheres, pois os homens têm de buscar fora o sustento de seus filhos e só vão para casa nos fins de semana. Elas vivem ainda hoje isoladas e discriminadas de uma forma cruel.

Por serem bandidas? Não. Uma antepassada delas foi excomungada pela Igreja há mais de 100 anos, por haver tentado ser um pouco feliz com seu novo companheiro. Como era casada, foi execrada pelos fariseus de plantão. A maldição atingiria quatro gerações de seus descendentes.

Ilustração Atômica Studio

Tiveram muitas filhas, que geraram muitos filhos, com os rapazes que ousaram delas se aproximar.

Fundaram uma comunidade singular em tudo: pela duração desse isolamento e pela dimensão de sua luta para provar que são dignas de respeito e afeto. São mulheres de idade ou bem jovens, saudáveis, cara limpa, sorriso aberto, numa fraternidade e cumplicidade comoventes.

Ali tudo é de todos, todas se ajudam, todas suportam juntas o isolamento e as calúnias. "Cuidado, lá vêm elas!", comenta-se quando chegam a outro povoado ou à capital para alguma compra necessária. T

udo lhes é dificultado: escola, atendimento médico e qualquer direito de cidadania. Os rapazes que com elas se relacionam, quando vão à cidade, são atormentados com insultos do tipo:

"Como se atreve a deixar sua mulher? Todo mundo sabe que elas não prestam. Meu amigo outro dia esteve lá, e foi uma farra".

Nos depoimentos, algumas choraram relatando a dureza dessa situação. Que talvez esteja acabando, pois, com muito trabalho e desejo de progredir, elas conseguiram instalar televisão e começam a conhecer o mundo. Botaram também a internet, outra janela para fora de sua condenação.

Finalmente, elegeram uma vereadora, fundaram uma associação e, após quatro gerações, talvez possam ser olhadas com o respeito que merecem mais do que tantas pessoas daqui de fora. O que vão ganhar na realidade, para além dos limites de seu delicioso e feliz povoado?

Tenho minhas dúvidas sobre as vantagens todas: vão conhecer corrupção e omissão, logro e malogro, frivolidade, violência e competição desleal.

Imagino que seja inevitável libertarem-se da difamação e serem integradas ao mundo. Mas quem sabe seria melhor botar o país inteiro dentro daquele vilarejo, vivendo de maneira simples, limpa, fraterna e feliz?

Não posso encerrar sem mencionar Ruth Cardoso. Uma das pessoas mais discretas e dignas entre nós.

Intelectual respeitada e generosa cuidadora dos desvalidos, que fundou o Comunidade Solidária, verdadeiro berço de iniciativas como o Bolsa Família, apenas com outros contornos – amparar, mas preparando para que os favorecidos logo possam ganhar seu sustento.

Pois essa verdadeira dama, em seus últimos meses, com a saúde frágil, foi achacada por quem pretendia (talvez ainda pretenda) expor suas contas e de seu marido, procurando ali algumas das tão comuns falcatruas atuais.

Neste país, a fronteira entre justo e injusto, verdadeiro e falso, correto e maldoso precisa ser urgentemente restabelecida.

Lya Luft é escritora
A aurora dos cinqüentões

Eles têm experiência e vitalidade.

Em vez de esperarem passivamente pela velhice, criam seus próprios negócios, estudam para manter a mente ativa e enveredar por outra profissão. Também se divertem na intimidade. No Brasil de hoje, o 50 é o novo 40

Quando se trata de desfrutar a vida com as vantagens da maturidade, mas a uma distância ainda segura dos desconfortos da velhice, o 50 é o novo 40.

Ou, dito de outra maneira: a combinação de experiência e vitalidade que até pouco tempo atrás caracterizava os quarentões agora também distingue homens e mulheres que ultrapassaram a barreira dos 50 anos.

A explicação de fundo para isso é, digamos, de saúde pública: as pessoas estão vivendo mais, e envelhecem melhor. As conseqüências da mudança são as mais diversas. Fazem-se sentir no mercado de trabalho, nas universidades, na vida privada.

As próximas páginas mostram que, hoje, cinqüentões trocam de bom grado o pijama de aposentado (ou a perspectiva iminente de vesti-lo) pela ousadia de abrir uma empresa – ou então preenchem vagas de destaque, e muito bem remuneradas, num mercado carente de mão-de-obra qualificada. Seu contingente aumenta nas carteiras do ensino superior, no qual eles são calouros com pinta de veteranos.

E, como não poderia deixar de ser, gente madura que faz ioga, musculação ou corrida, ainda que não exiba as formas extraordinárias da cinqüentona Madonna, fica bem mais à vontade entre quatro paredes.

As reportagens a seguir confirmam, enfim, que um número crescente de pessoas dá valor à bagagem de vida que acumularam. Como disse o satirista inglês P.G. Wodehouse, elas sabem que não existe cura verdadeira para os cabelos grisalhos – e, por isso mesmo, fazem deles o melhor uso possível.

Velhice? fica para mais tarde

Com cuidados estéticos, alimentação saudável e atividade física, quem faz 50 anos (e não parece) adia a hora de envelhecer

Silvia Rogar e Sandra Brasil

Tony Barson/Wireimagem/Getty Images

Old girl, jamais: fanática por exercício físico e empenhada em disfarçar todo e qualquer sinal da idade, Madonna chega ao meio século em pleno palco, pulando, dançando, cantando e se contorcendo de maneira insinuante

No dia 23 de agosto, Madonna estará dançando, pulando e se contorcendo de maneira insinuante em Cardiff, País de Gales, a primeira parada de sua turnê com o novo show, Sticky & Sweet, que vai até o fim de novembro.

Será, a essa altura, uma senhora de 50 anos, idade que completa uma semana antes, no dia 16. Isto mesmo: Madonna, a loira de músculos definidos, magérrima e conservadíssima, é cinqüentona.

Sua figura é produto de uma dose excepcional de disciplina (e de exercícios), mas estar bem na sua idade não tem nada de incomum. Só no mundo dos artistas, onde imagem não é tudo mas chega perto, também acabam de dobrar o cabo dos 50 anos as atrizes Sharon Stone (em março) e Michelle Pfeiffer (em abril), beldades de parar o trânsito em qualquer tapete vermelho.

Ultrapassou a mesma barreira no ano passado a atriz Christiane Torloni, que na novela das 7 da Rede Globo, Beleza Pura, disputa com a própria filha o amor de Guilherme (Edson Celulari, 50 em março).

Como comprovam as contas do dermatologista, da academia e da farmácia, as mulheres precisam se dedicar com afinco à missão de estar bem na metade da vida. Homens, um pouco menos, para a eterna inveja delas.

Como cabelo grisalho e rugas discretas nunca foram impedimento para o sucesso social masculino, permanecem galãs apesar (ou por causa) da idade madura os irresistíveis Pierce Brosnan, um poço de charme aos 55, Richard Gere, inalterável jeitinho carente aos 58, e José Mayer, que, aos 59 e longe de sua melhor forma (por força do papel, ressalte-se), anda aos beijos com Juliana Paes em A Favorita, folhetim das 8 da Globo.

Com ou sem muito esforço, o fato é que a população de meia-idade (termo, por sinal, cada vez mais impopular) envelhece (mais impopular ainda) com muito menos marcas, internas e externas, do que seus pais.

Reginaldo Teixeira
Lalo Yasky/Wireimage/Getty Image




Galã em qualquer situação: Mayer, 59, faz papel de hippie desleixado. Mesmo assim, beija Juliana Paes Quanto mais velho, melhor: Gere, 58, rugas e cabelo branco. E as mulheres ainda querem pôr no colo

Cinqüentões hoje adotam hábitos alimentares mais saudáveis (quem é do grupo e não usa adoçante, inclusive na caipirinha, levante a mão) e põem o corpo para trabalhar, em academias e em treinos de corrida.

"A turma na faixa dos 50 anos foi a que mais cresceu nas nossas escolas. Em 1993, essas pessoas representavam menos de 4% do total. Hoje são 13%", diz Richard Bilton, presidente da Companhia Athletica, a maior rede de academias do Brasil.

Ao cuidarem da forma, os atletas maduros incrementam sua vida social. Em outras palavras: treino físico também é badalação. A corrida é seguida de jantar com os amigos – quando não significa uma viagem em grupo.

Danilo Borges
A vaidade compensa: Christiane, 51, disputa o mesmo homem com a filha (na novela). Deve ganhar

Lailson Santos

Arvorismo nas horas vagas: Flor, 53, e Silva, 55, namoraram, se separaram, se reencontraram, voltaram a namorar, foram morar juntos e vão se casar. "Quero ter saúde para curtir tudo o que pudermos por mais trinta, quarenta anos", diz ela

"Minha mulher não quer saber de correr, mas adora me acompanhar nas viagens", diz o executivo gaúcho Paulo Tonding, 54 anos, corredor há quatro. Tonding aderiu a esse esporte por recomendação médica – era hipertenso e tinha colesterol alto.

"De cada dez pessoas com mais de 50 que nos procuram, oito foram aconselhadas pelo médico a perder peso e praticar atividade física", observa o preparador físico Mario Sergio Andrade Silva, dono da Run&Fun, de São Paulo, onde 11% dos alunos estão nessa faixa de idade.

"Eles são os mais dedicados, porque sabem o que querem", diz Andrade Silva. Tonding, por exemplo, quer acumular medalhas de participação: já tem 83, entre elas as de cinco meias maratonas e as de três maratonas inteiras.

No momento, prepara-se para a maratona de Nova York, em novembro, para onde embarca com a mulher, Jussara, o filho, a filha e namorados. "Eles me aplaudem na chegada e eu ofereço a eles uma semana de turismo", diz.

Inevitavelmente, a boa disposição aos 50 anos produz ondas gigantes no mar dos relacionamentos, como comprovam a explosão de casamentos (mais 113% eles, mais 131% elas) e a de separações (mais 55% no total) nos últimos dez anos (veja o quadro). "É uma mudança que acompanha o aumento da expectativa de vida", diz a psiquiatra Carmita Abdo, da Universidade de São Paulo.

Carmita publicou no ano passado os resultados de uma pesquisa realizada com 10 161 pessoas com idade média de 52 anos. Pois 96,8% dos homens e 77,6% das mulheres se disseram sexualmente ativos nos doze meses anteriores. "Como um cinqüentão não aparenta a idade, nem se sente velho, sua vida afetiva está em aberto.

Ele precisa reinventar continuamente um casamento que ainda vai durar décadas, ou buscar novos caminhos", afirma a psiquiatra. Entre as mulheres, as mudanças são mais notáveis. "Elas estão mais confiantes e confortáveis.

A grande novidade está na palavra ‘opção’. Hoje as mulheres de 50 podem escolher o que querem fazer", diz a psicóloga americana Nancy Etcoff, professora da Universidade Harvard, que coordenou uma pesquisa entre quase 1 500 mulheres de 50 a 64 anos em nove países, inclusive o Brasil, encomendada pela Dove, marca de produtos de higiene e beleza, para identificar a imagem que elas têm de si mesmas. Conclusão: a imagem é positiva, embora morram de medo de engordar.

E elas juram que têm orgulho da idade (veja o quadro).

Lailson Santos
Arvorismo nas horas vagas: Flor, 53, e Silva, 55, namoraram, se separaram, se reencontraram, voltaram a namorar, foram morar juntos e vão se casar. "Quero ter saúde para curtir tudo o que pudermos por mais trinta, quarenta anos", diz ela

Boa forma, boa viagem:

Tonding, 54, treina corrida, coleciona medalhas e se prepara para a maratona de Nova York, para onde vai com a família toda. "Eles me aplaudem na chegada e eu ofereço a eles uma semana de turismo", diz

Exemplo da disposição para encarar mudanças radicais, a paulistana Flor Mascarenhas, maquiadora de filmes publicitários, 53 anos, de bem com a idade ("Não ando mais de minissaia, mas também não me escondo num tailleur"), reencontrou há quatro anos um namorado da adolescência, o analista de sistemas Antônio Carlos da Silva, 55 – ela, sozinha, ele enredado num casamento malsucedido.

Silva se separou, foram morar juntos e neste ano, pela primeira vez, Flor vai se casar no papel. "Casar marcará esse reinício de vida", resume Silva, que com a mulher pratica mergulho e arvorismo nos fins de semana.

"Quero ter saúde para curtir tudo o que pudermos por mais trinta, quarenta anos", diz ela. E assim, pouco a pouco, o caminho já andado se transforma em alvorada de uma longa e profícua segunda metade da vida.