sábado, 2 de fevereiro de 2008



02 de fevereiro de 2008
N° 15498 - CLÁUDIA LAITANO


Viva o biquíni

Às vésperas da festa nacional dos corpos sarados, um dos assuntos desta semana, vejam só, foi o direito de usar biquíni GG. A pequena polêmica de verão começou com uma idéia de mau gosto e cresceu ao longo dos últimos dias com comentários em blogs e sites de variedades.

O ponto de partida foi a capa de uma revista de fofocas que estampava duas fotos de praia.

De um lado, a cantora Preta Gil, 33 anos, baixinha, gordinha, mãe de um garoto de 13 anos. Do outro a apresentadora Sabrina Sato, 27 anos, sem filhos, malhada e turbinada. A intenção, não exatamente sutil, era explicitada com dois carimbos: "não vou" e "vou", respectivamente.

Quando olhei a capa da revista, lembrei de um episódio curioso que aconteceu comigo há alguns anos. Estava atravessando a rua meio distraída, ou apressada, ou os dois, e por pouco não fui atropelada.

O motorista se assustou - e como voltar e me atropelar direito talvez causasse alguns problemas, preferiu uma vingança mais ardilosa. Colocou a cabeça para fora da janela e gritou, para toda a rua ouvir: "Além de cega é feia!".

Como Preta Gil - e a grande maioria das mulheres - mantenho com minha auto-estima uma relação de altos, baixos e médios. Isso significa acordar um dia ou outro sentindo-se um desastre, noutros simplesmente opaca e, de vez em quando - ainda bem - linda e colocada.

Mas ouvir um anônimo bobalhão me chamando de feia no meio da rua teve exatamente o efeito planejado. Fiquei chocada, paralisada, a um passo de chorar como uma menina que perdeu a boneca.

Tudo isso por mais ou menos 30 segundos - o tempo de juntar a auto-estima do chão e terminar de atravessar a rua.

Moral da história: é muito fácil atingir a auto-estima de uma mulher a respeito de sua aparência. Tão fácil que beira a covardia. Isso porque todas as críticas sobre forma, tamanho e embalagem que possam ser feitas passam antes pela nossa cabeça, sem que ninguém precise gritar impropérios no meio da rua.

Minha reação ao ver a capa da revista, portanto, foi de imediata empatia com a mulher comum, a moça sem corpo malhado que vai à praia de biquíni e estende sua esteira ao lado de uma menina de corpo perfeito sem necessariamente sentir-se inferior.

Porque fazer isso é sempre uma vitória - diante das próprias inseguranças, antes de mais nada, mas também diante de convenções que parecem verdade absoluta quando são apenas determinações culturais.

Cultura é o caldo em que estamos mergulhados sem nem nos darmos conta, é o que nos induz a tomar decisões que nos parecem obrigatórias - até que alguém comece a fazer diferente.

Por estranho que pareça, ir ou não à praia de biquíni nem sempre é uma decisão individual, que se toma em casa calmamente diante do espelho.

Uma jovem mulher dos anos 70 tinha uma relação com o corpo, nós temos outra. Européias, japonesas, americanas encaram a beleza - e a ausência de - de formas diferentes.

Ou seja: a época e o lugar contam mais do que os quilos extras na hora de decidir o que queremos ou não usar na praia. Preta Gil pode não ser padrão de beleza em nenhuma praia do mundo nos dias de hoje, mas ter ou não ter liberdade para exibir um corpo imperfeito é, sim, cultural e portanto questionável.

Talvez o biquíni da Preta Gil seja uma bandeira de liberdade, como foi a sunga de crochê do Fernando Gabeira ou o barrigão de fora de Leila Diniz. Mudanças de costumes acontecem o tempo todo, e em todos lugares - inclusive na praia. Longa vida ao biquíni GG.

A professora de inglês Lígia Beskow de Freitas escreve para corrigir o título da coluna da semana passada, Smoking/No Smoking: "O correto seria Smoking or NON-smoking, já que são adjetivos; o segundo recebe o prefixo NON". Obrigada, professora, essa eu não erro mais!

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