quinta-feira, 31 de janeiro de 2008



31 de janeiro de 2008
N° 15496 - Nilson Souza


A máquina da verdade

Faz sucesso no biguebroder, como já fazia em outros programas de televisão populares, a tal máquina da verdade - um aparato capaz de detectar variações reveladoras na voz e na expressão corporal de quem está sendo submetido a um questionamento.

Trata-se de um programa de computador similar ao que a polícia israelense utiliza para interrogar terroristas.

É uma evolução do célebre polígrafo criado pelos discípulos do criminalista italiano Cesare Lombroso, mencionado recentemente neste polêmico projeto de pesquisa com adolescentes infratores.

Lombroso, só para lembrar, desenvolveu a tese do criminoso nato, que podia ser identificado por algumas características corporais - entre as quais lábios grossos e orelhas grandes, o que já me deixaria, no mínimo, na condição de suspeito.

Suas teorias foram superadas, para alívio dos feios e dos tatuados. Tendência à tatuagem era, também, um dos indicadores da propensão à delin- qüência. Hoje a moda se encarregaria de desmoralizar esta hipótese.

Mas o polígrafo da verdade sobreviveu e vem sendo aperfeiçoado pela tecnologia, que a cada dia acrescenta-lhe um novo item de precisão.

Ainda assim, os especialistas reconhecem que é possível enganar a máquina. Pessoas muito controladas, como os psicopatas, são capazes de se submeter ao teste sem maiores alterações.

Já os mais sensíveis emocionalmente correm o risco de passar por mentirosos simplesmente porque ficam nervosos quando são alvos de atenção.

Tive um colega de faculdade tão tímido que a diversão da turma era olhar para ele e dizer: "Fica vermelho!". E ele incendiava. Imaginem um sujeito desses no detector de mentiras! Aposto que passaria por inconfiável. E, por tê-lo conhecido bem, posso atestar que era quase um santo.

Dizem que o homem é o único animal capaz de ruborizar por ser também o único que tem razões para isso. Mas a maioria, sabemos, não demonstra tão facilmente seus sentimentos.

Pelo contrário, somos muito mais hábeis para fingir do que para revelar, até mesmo porque a vida em sociedade exige algum grau de hipocrisia. Se a tal máquina da verdade fosse absolutamente precisa, é provável que os conflitos humanos se multiplicassem.

De minha parte, confesso que prefiro continuar confiando na minha intuição e nas pessoas que ainda enrubescem por nada. Aprecio a sinceridade, amo a franqueza, mas tenho uma certa reserva em relação a verdades absolutas, ainda mais quando atestadas pela precisão de uma máquina que não foi programada para entender as fraquezas humanas.

Tudo bem, podem me acusar de ser excessivamente tolerante. Daria para esperar outra coisa de quem tem lábios grossos e orelhas grandes?

Uma excelente quinta-feira ainda que com chuva por aqui.

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