sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023


24 DE FEVEREIRO DE 2023
CARPINEJAR

Benditas férias parceladas

Sempre fomos adeptos de férias inteiras: esquecer o trabalho por um mês, de tal forma que voltávamos irreconhecíveis, com a marca do chinelo nos pés e o olhar de lobo selvagem. Demorávamos a nos adaptar, a retomar o ritmo frenético da comunicação, agíamos como estreantes em nossas velhas poltronas profissionais de rodinhas.

Éramos súditos da imersão em janeiro ou fevereiro, na alta temporada. Além dos preços nas alturas, havia um problema no descanso longo. Depois do 10º dia na praia, transformávamos o lazer em uma outra mesmíssima rotina, como se morássemos à beira-mar.

Aquilo que surgia no princípio como novidade, como aventura, com a adrenalina do choque cultural, começava a se transformar num marasmo total: caminhar de manhã, tomar banho de mar, almoçar, sestear, passear no centrinho, jantar, jogar cartas, assistir à televisão.

Nem o mais lindo litoral freava a consolidação dos costumes. Não havia mais a sensação de liberdade de antes. Apenas transferimos a agenda da cidade grande para uma maratona fixa da cidade pequena. Após a fase inicial de encantamento, os programas se repetiam e não havia muito mais a conhecer.

Percebemos, então, que tudo o que é bom e agradável, quando posto num cenário prolongado, também desanda no comodismo. Em substituição aos 30 dias de férias, preferimos fatiar o nosso direito trabalhista em três viagens, de 10 em 10 dias. Assim passamos a sair de férias três vezes ao ano, não somente uma única e longa vez.

A decisão mudou a qualidade de nossa convivência. Não tínhamos mais risco de normalizar as descobertas e entrar no modo automático. Vivíamos no pico do fôlego e do ânimo, querendo sair, dançar, curtir a areia. Nenhum de nós mais se estressava. Não perdíamos o prazer da fruição. Os pontos turísticos não eram menores do que as datas em cada local.

Tempo demais em família cansa para todos. É uma verdade que ninguém diz, porém qualquer um sente. Filhos não aguentam os pais tão perto, os pais já não sabem o que fazer para namorar com os filhos perto, afora as visitas dos parentes quando descobrem que você está com uma alentada e oportuna estada em lugar fixo.

Chega um momento em que se tem saudade dos incômodos profissionais e da falta de folga no serviço. O perigo é se encontrar na rede, com a brisa marinha, e sonhar com o retorno para perto dos seus colegas, para se ver um pouco sozinho do tumulto familiar.

Férias num único tiro lembram aposentadoria. Férias parceladas aumentam as possibilidades de conhecer lugares novos e de manter a atenção em alta voltagem. Você não se afasta excessivamente para estranhar o emprego, some por uma trégua necessária para reaver a criatividade e a paz de espírito.

CARPINEJAR

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