terça-feira, 1 de março de 2011



01 de março de 2011 | N° 16626
LIBERATO VIEIRA DA CUNHA


Uma nova chance

Leio que o MEC está recomendando às escolas abolir a reprovação nos três primeiros anos do ensino fundamental. A diretriz reprisaria o êxito de medida semelhante adotada em países como o Japão e a França, onde se renovou o interesse pela sala de aula e reduziu a evasão.

É uma antiga tentação brasileira transpor modelos externos prontos e acabados para a nossa realidade, como se a simples etiqueta estrangeira fosse garantia bastante e suficiente para resolver nossos problemas.

Quase sempre não é.

Quando cursei as séries iniciais do primário no Colégio das Dores, de Porto Alegre, os irmãos lassalistas costumavam distribuir pequenas estampas aos alunos que se destacavam em alguma matéria. Não era nada de fabuloso. Apenas um cão, um gato, um rádio, que contavam pontos para a premiação final.

Significavam muito. Queriam dizer que uma redação de português, uma prova de aritmética, um questionário de geografia estavam além da expectativa. E nós, os guris, nos sentíamos contentes por estar correspondendo ao que esperavam de nós.

Vários anos mais tarde, num outro colégio, adotaram as aulas livres de inglês. Não distribuíam estampas de cães ou de rádios, mas requeriam dissertações sobre as maravilhas de Londres. Em resumo, nos pediam que elogiássemos os prodígios daquela cidade, para comparar nossas composições com outras vindas do Egito, da Índia ou da Austrália.

Nada disso me tornou mais sábio. Mas me desafiou a explorar matérias que eu não percorrera. Me provocou a vencer obstáculos que eu desconhecia. Me instigou a encarar dificuldades que eu não havia transposto.

Voltando agora ao fim das reprovações, devo lembrar que houve uma calamitosa abolição das avaliações de leitura no Rio de Janeiro.

Não quero com isso dizer que vá acontecer sempre.

Mas se o sistema de reprovações funcionou até hoje, sem grandes traumas existenciais, não seria justo dar-lhe uma nova chance?

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