sábado, 3 de abril de 2010



04 de abril de 2010 | N° 16295
MARTHA MEDEIROS


Vidas gastas antes do tempo

A pergunta mais aterrorizante hoje em dia é: “Que idade você me dá?”

Um dos fenômenos mais comentados nos dias que correm é a longevidade humana e seus efeitos estéticos. Hoje um homem ou uma mulher pode chegar aos 70 anos com cara de 60, e aos 60 com jeito de 50, lembrando que os 50 são os novos 40, e assim eliminamos 10 anos da nossa aparência, bastando para isso uma boa alimentação, exercícios físicos e uma ajudazinha de procedimentos que se tornaram corriqueiros, como aplicações de botox, preenchimentos e intervenções cirúrgicas.

Por causa disso, a pergunta mais aterrorizante hoje em dia é: Que idade você me dá?. Por favor. A pessoa pode ter 36, 48 ou 57, como responder sem ferir suscetibilidades? Dos 30 aos 60 estão todos com a mesma cara.

Reconheço que a nossa aparência jovial é um assunto que já saturou. Ninguém fala em outra coisa, e os elogios que são ouvidos nas ruas só confirmam o milagre do rejuvenescimento.

“O tempo não passa pra você”.

“Rapaz, você está igual, só que com menos cabelo”.

“Você já tem 50? Ninguém diria!”

Até parece que conseguimos finalmente parar o tempo. Mas é mentira que estamos todos com a mesma cara. Olhe bem para o rosto de uma mulher que passou anos lavrando a terra no interior do Estado e criando sete filhos sem ajuda alguma. Quantos anos você lhe dá?

Estamos esquecendo que, para muita gente (um grupo bem maior do que a nossa turminha), perdura outro milagre: o do envelhecimento precoce. São aquelas pessoas que você jura que têm 40 anos, mas que têm 29.

Que você daria uns 55 sem titubear, mas que acabaram de completar 38. Só que eles não estão nas páginas das revistas para exibir esse também inacreditável efeito estético que a vida lhes proporciona.

O rosto conta a nossa história? Estou certa disso. Conta a respeito das facilidades cosméticas que tivemos acesso, aliadas ao nosso bem-estar e à nossa qualidade de vida, já que nossos problemas quase sempre são de ordem psicológica e se alojam mais na alma do que na pele.

Mas muita gente traz no rosto as marcas da luta diária pela sobrevivência, onde não há acesso a complexos vitamínicos, filtros solares nem muito motivo para achar a vida encantadora.

Eu a vi na tevê dia desses: era uma mulher com o corpo delicado, mas com mãos de estivador por causa do manuseio da enxada. Acorda todos os dias às 4h da manhã e lava seu cabelo desgrenhado com sabonete e água gelada. Seu rosto inteiro parecia a ponta de um dedo murcho, como quando se fica muito tempo dentro da piscina. O pescoço era um despenhadeiro.

Dois seios vazios, dois braços manchados e um filete de voz. Parecia ter uns 90 anos, no entanto, era bem mais jovem do que eu e você, ninguém diria.

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