sábado, 5 de setembro de 2009



06 de setembro de 2009
N° 16086 - MARTHA MEDEIROS


Celebrando tudo

Nos Estados Unidos, quando alguém morre, é comum reunir a família e os amigos depois dos atos fúnebres para uma confraternização, onde se oferece comida e bebida. Eu não chamaria isso de uma festa, e sim de um recurso para a troca de carinho e afeto, e para sinalizar que a vida continua, a despeito daquele que se foi.

Bem diferente me parece essa onda de celebrar divórcios, que está se firmando como um costume americano e que começa a fazer marola por aqui. No Exterior, já existem até empresas especializadas em organizar a festança – e dá-lhe gastar dinheiro com bobagem.

Uma separação, mesmo quando muito desejada, não é exatamente uma ocasião feliz. Não chego a considerar um fracasso, mas é uma ruptura que envolve variados sentimentos. O alívio pode ser um deles, mas não evita a melancolia. Isso em se tratando de separações amigáveis e civilizadas, porque na maioria das vezes as pessoas saem despedaçadas, sofrendo muito. Fazer uma festa pode servir mais como fuga do que como uma celebração.

Não me parece nada animador ver os convidados, ao final da noite, irem embora deixando o novo solteiro com a casa toda desarrumada e indo pra cama sozinho, em lua-de-mel com ninguém.

Óbvio que uma pessoa que passou por uma separação vai um dia procurar os amigos, sair, se divertir. Acontecerá naturalmente, quando se sentir disposto. Mas antes de essa disposição chegar, não há razão para negar o abalo e passar batido pelo luto.

Reconheço que uma festa de separação tem um forte componente de humor (alguns aproveitam para espalhar fotos do ex pela casa e promover um tiro ao alvo coletivo), quando não uma pitadinha de grosseria (outros imprimem o nome do ex no papel higiênico do lavabo), só que não basta uma única noitada para determinar o fim de uma era e o começo de outra.

Se a dor ainda estiver latente, seguirá latejando. E se não houver dor nenhuma, então a festa não passa de mais uma imitação boba do que os gringos fazem lá por cima.

Não tenho nada contra celebrações, e imagino que muitos fazem essas despedidas de casado por farra mesmo. Mas só vejo sentido nisso se a festa for comandada pelos dois juntos (ex-marido e ex-mulher) celebrando não o final de um casamento, mas o início de uma bela amizade depois de terem compartilhado gratificantes momentos juntos. Aí até pode ficar original e elegante.

Do contrário, a festa sugere uma esnobação, como se o passado não tivesse valido a pena, ou uma tentativa vã de fugir do sofrimento, como se o contato íntimo com a dor não fosse fundamental para a gente compreender melhor o que foi vivido. É a tal praga de se sentir obrigado a ser feliz o tempo todo.

Se isso estiver soando politicamente correto demais, então ignore: vá em frente, festeje o fim da sua relação escravagista e solte a franga com os amigos. Chique não é, mas você terá sempre a desculpa de, à moda americana, estar celebrando a morte (o fim de um amor é sempre uma morte) para sinalizar que a vida continua.

Bem Riveira está muito cheia este fim de semana, com ruas congestionadas de povo e de carros. Mas há gente bonita e incrível que no almoço em São Gabriel fomos sentar ao lado de uma mesa com colegas de todos os dias de dois andares acima. Ah essas coincidências.

Um domingo gostoso, especialmente para você.

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