quarta-feira, 24 de junho de 2009



24 de junho de 2009
N° 16010 - MARTHA MEDEIROS


Nós, os trogloditas

Semana passada recebi uma enxurrada de informações enaltecendo o vegetarianismo e condenando a prática de se matar animais para comer.

Eu, que deliro diante de uma picanha mal passada, já estava me achando a mulher de Neanderthal quando, em meu socorro, sem que eu houvesse solicitado, me chegou por e-mail um capítulo do livro Incríveis Casos Verdadeiros, do gastroenterologista carioca Geraldo Siffert Junior, em que ele redime a carne vermelha, inclusive contando casos engraçados, como o do dia em que, por volta das 17h, percebeu que ainda não havia almoçado e resolveu entrar numa churrascaria que estava praticamente vazia, a não ser por um sujeito solitário que estava ali num canto atracado numa costela.

Qual a surpresa do médico ao reconhecer que era seu melhor amigo, notório vegetariano da cidade, que ficou lívido: “Me sinto como se você tivesse me surpreendido com uma amante. Isso é hora de você aparecer? Churrascarias, nesse horário, são alcovas!”.

Revistas especializadas já absolveram a carne vermelha, salientando seus valores nutritivos, como a proteína e o ferro, além de confirmar que as menos gordurosas são fundamentais para a musculatura de pessoas idosas, mas nada disso melhora a imagem dos carnívoros: dizem que o pobre do boi não merece pagar o pato. Nem mesmo o pato merece pagar o pato. Quem come bicho morto é a escória.

E o que dizer de Obama, que matou uma mosca não para comê-la, mas para fazer gracinha diante das câmeras? Adorei a desenvoltura do presidente norte-americano. Obama se concentrou, mirou e pum: abateu-a de um golpe só. Pois o que era para ser apenas uma atitude descontraída, acabou atiçando os brios do pessoal do Peta, que defende os direitos dos animais.

A organização não se conformou com a execução ao vivo: “Apoiamos a compaixão mesmo por animais pequenos, estranhos e desagradáveis”, declarou o porta-voz Bruce Friedrich, que por certo também luta pela preservação dos ácaros. E não parou por aí: “Esmagar uma mosca na TV mostra que Obama não é perfeito”.

Pois é, Bruce, Obama não é perfeito, e ainda por cima é chegado num bife. Perfeitos são os que patrulham as pessoas que matam moscas e que se alimentam de carne. Nem todo mundo é evoluído, Bruce. Nem todos têm seu grau de consciência ecológica e ambiental. Ainda há muita imperfeição no mundo. Diria até, Bruce, que há imperfeições mais nocivas à sociedade do que as que você combate.

Dá para acreditar que há seres humanos que, além de comer carne e matar moscas, são capazes de jogar bombas em passeatas gays, de empregar parentes que são pagos com dinheiro público, de esfaquear maridos e de espancar meninas até provocar traumatismo craniano? Pois é, Bruce: tem gente que mata gente. Ou gente e mosca dá no mesmo?

Sempre respeitei os vegetarianos e respeito quem preserva a vida dos animais. Mas enquanto não for crime comer carne e matar insetos, que os Bruces deixem de ser radicais e também tolerem as escolhas que, nós, os trogloditas, ainda temos o direto de fazer – pelo visto, não por muito tempo.

Uma ótima quarta-feira para nós todos.

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