sábado, 11 de outubro de 2008



11 de outubro de 2008
N° 15755 - NILSON SOUZA


Crianças para sempre

Parada de ônibus, sete da manhã. Dois passageiros esperam, solitários e silenciosos.

Passo no meu passo de caminhante matinal, como recomenda o doutor Moriguchi. Pisando firme, movimentando os braços, concentrado no percurso e na minha própria respiração. Mas meus olhos se desviam para o casal madrugador que aguarda o ônibus. Observo-os, curioso.

É uma mãe, intuo, acompanhada por um rapaz de idade indefinida. Ela tem um mapa indecifrável de sulcos no rosto. Ele tem um inconfundível olhar oblíquo, fixado no nada. Estão de mãos dadas, ele sereno, ela vigilante.

– Pobre mãe! – comento com meus botões, e sigo adiante.

Mas não deixo de pensar naquelas pessoas. Sempre me comovo quando vejo mães ou pais acompanhando filhos portadores de deficiência. Fico imaginando que só mesmo o mistério do amor incondicional explica tamanha abnegação.

Passei a valorizar ainda mais essas heróicas criaturas no dia em que conheci uma instituição que abriga pessoas especiais, abandonadas por suas famílias. Confesso que na primeira vez levei um choque ao ver aqueles homens e mulheres condenados a ser crianças para sempre.

Depois, ao visitá-los outras vezes, deixei de vê-los com olhos de espanto e percebi que são seres humanos mais humanos do que muitos dos que consideramos normais.

Meus últimos preconceitos se desfizeram no dia em que conversei com a mãe de uma menina com síndrome de Down e ouvi dela a seguinte declaração:

– Minha filha é uma bênção.

Então ela me disse que tinha sofrido bastante no início, quando descobriu que sua criança não era igual às outras. Com o tempo, porém, foi percebendo o quanto ela era sensível, carente de seu afeto, amorosa e feliz.

Passou, então, a compartilhar de cada etapa do seu desenvolvimento, a vibrar junto a cada pequena conquista, a valorizar coisas simples que só os puros de espírito conseguem identificar.

Nem sempre é assim. Às vezes, as pessoas não estão preparadas para enfrentar o acidente genético que interrompe seus sonhos de gerar seres belos, perfeitos e inteligentes. Então, optam pela fuga da responsabilidade. Não as condeno.

Cada um sabe a carga que é capaz de suportar. Desconfio, porém, que muitas delas talvez tenham desperdiçado a oportunidade de transformar uma eventual desventura na bênção de segurar a mão do filho por toda a vida.

Ainda que com chuva, um ótimo sábado e um excelente fim de semana.

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