domingo, 10 de agosto de 2008



10 de agosto de 2008
N° 15690 - MARTHA MEDEIROS


Os novos pais

Um dos vídeos campeões de acesso do You Tube é a palestra realizada em setembro de 2007 por Randy Pausch na Universidade de Carnegy Mellon, em Pittsburgh, EUA. Randy era um professor de informática que recebeu um diagnóstico de câncer no pâncreas e uma sentença desconcertante: teria apenas de três a seis meses de vida.

Com 46 anos e três filhos pequenos, ele transformou essa palestra numa espécie de aula sobre a importância de se realizar sonhos, de viver bem e de se divertir até o último suspiro, e tudo isso virou um livro chamado A Lição Final, best-seller publicado em mais de 30 países, inclusive no Brasil.

Randy viveu um pouquinho mais do que o previsto, mas acabou falecendo no último dia 25 de julho. Eu havia recebido o livro, mas ficou esquecido num canto.

Aproveitei para lê-lo agora. A tendência é santificar Randy Pausch, mas, não espalhe, ele me pareceu um sujeito meio esquisito, cheio de manias. Só que a essa altura, isso não tem mais a menor importância.

O que vale é que o objetivo dele ao fazer a palestra e o livro foi deixar uma herança de valores para seus filhos, já que, na idade em que estavam, dificilmente assimilariam alguma coisa numa conversa (todos têm menos de seis anos de idade).

Parece tudo muito óbvio, e é. Qualquer um de nós, nessa situação, trataria de deixar cartas, gravar vídeos caseiros, tirar fotos e promover aventuras que se tornassem inesquecíveis para nossos filhos. Por exemplo, em seus últimos meses de vida, Randy levou-os para mergulhar com golfinhos. Acertou na mosca.

Passeios originais não costumam mesmo sair da nossa lembrança: percorrer trilhas em montanhas, acender fogueiras gigantes, dormir em cavernas. Minhas memórias de infância estão quase todas ligadas a viagens com meus pais, ainda que nunca tenhamos dormido em cavernas.

A intenção de Randy era que seus filhos se sentissem muito amados, pois tendo certeza disso, eles lidariam com a orfandade paterna sem tanto trauma. O que me faz pensar: e os pais que estão vendendo saúde, têm se dedicado também? Pois salve! Hoje em dia, a relação pai e filho mudou demais, e para melhor.

Os homens até parecem estar com os dias contados, tamanha é a consciência que possuem da sua importância para a formação saudável dos filhos. Há uma quantidade enorme de pais quarentões que não precisam de nenhum estímulo extra (ou mórbido) para manifestar amor. Chegam a ser quase exagerados.

Eu não sou muito fã de exageros, mas antes isso do que a indiferença, o cansaço ou a falta de jeito para a paternidade. Essa nova geração de crianças que têm pais extremamente carinhosos e participativos será poupada de muitas neuras.

Sentir-se amado na infância não é uma questão meramente circunstancial: é o que vai nortear nossas escolhas e atitudes, é o que vai estimular nossa segurança ou dar vazão às nossas carências. Sentir-se amado é o legítimo “biotônico fontoura” da auto-estima.

Randy, no livro, agradece por ter tido alguns meses para preparar sua saída de cena. Poderia ser pior: morrer num acidente ou num infarto fulminante, sem chance de despedida. Corajoso, ele, porque a maioria de nós, se pudesse, escolheria um pá-pum - fui.

De qualquer maneira, a contragosto, todos iremos. Então fica essa lição que é óbvia, sim, mas nem por isso desimportante: enquanto estivermos por aqui, é bom não perdermos nenhuma oportunidade de dar o nosso recado. Ao vivo, de preferência.

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