domingo, 7 de outubro de 2007


Xico Sá

O seu orgulho não vale nada

Somente um chifre, como é vulgarmente batizado o incômodo adereço das nossas frontes, humaniza um macho

Embora o ato de pular a cerca se constitua em um dos principais esportes masculinos, o pânico diante da possibilidade de ser traído tira o sono, a concentração, o prumo, é capaz de cegar um homem e fazê-lo um monstro, um animal paranóico ruminando o capim do ciúme.

Mas não podemos nos esquecer, moços, pobre moços da canção de Lupicínio, que somente um chifre, como é vulgarmente batizado o incômodo adereço das nossas frontes, humaniza um macho _faz dele uma criatura menos arrogante, menos tosca, mais meiga e sensível para futuras histórias.

Motivo de tragédias e canções, o tema da traição, no banquete filosófico do botequim, muitas vezes ganha tintas humorísticas. Amigo provocando amigo ou narrando infortúnios alheios.

Momento adequado para uma antologia de frases e ditos populares machistas: “Chifre é coisa de homem, o boi usa de enxerido”; “Um homem sem um chifre é um animal desprotegido” etc. etc. No bar, aliás, está um dos personagens que mais entende do assunto: sua excelência o garçom.

É no ombro dele que muitos de nós choramos como vira-lata abandonado até pelas próprias pulgas. É o garçom também a testemunha ocular de novos flertes e enlaces que representam o fulgor de uns e a desgraça de outros.

O bom garçom, aliás, sente de longe o drama de um sujeito maltratado pelo destino amoroso. Você não precisa nem dizer nada. Quando a vida dói, drinque caubói, parece recitar o gravatinha enquanto serve o seu bourbon ao amigo sem rumo.

Para os moços, pobre moços, o pior da traição é que as pessoas do seu convívio, principalmente os outros homens, tomem conhecimento. Se o algoz for alguém próximo, da mesma rua, do mesmo bairro, da mesma firma...

É o fim do mundo. Se o algoz for seu concorrente direto, meu Deus, tirem as armas do seu alcance. É, amigo, é o velho ego de macho que não tolera rachaduras.

Às vezes está morrendo de amor e vontade de voltar para a ex. Não volta por questão de honra, fera ferida, o medo do homem diante do olhar dos amigos, dos vizinhos, do colega de trabalho.

Mal sabem eles que esse orgulho não vale uma canção triste e sofrida de Leonardo Cohen, do Chico ou do Roberto!

Xico Sá é colunista da Folha

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