quarta-feira, 21 de junho de 2017



21 de junho de 2017 | N° 18877 
MARTHA MEDEIROS

Desculpe aí, Louis Armstrong

Recebi um vídeo comovente pelo WhatsApp. Mostra uma sequência de cenas espetaculares da natureza: florestas, mares, vulcões, os animais, as flores, o melhor da National Geographic. Todo esse esplendor embalado pela voz grave de Louis Armstrong cantando What a Wonderful World, que você conhece, claro: “I see trees of green, red roses too, I see them bloom, for me and you, and I think to myself...” corta! 

Escutei bloom ou “BUM for me and you”? Pois certas notícias cotidianas me atingem feito um tiro, como a do garoto que foi torturado com uma brutal tatuagem na testa, pra ficar apenas com esse exemplo inovador de barbárie. O chamado “risco de vida” sempre nos rondou, mas agora ele está mais ameaçador e mais valente – ou mais covarde, dependendo do ponto de vista.

Dirigir automóveis em vias urbanas sempre foi arriscado, mas agora é arriscado também caminhar pelas calçadas, tal a quantidade de buracos e de pavimento assimétrico.

Sair à noite era normalmente arriscado por causa dos assaltos, agora é arriscado também de manhã e à tarde – violência democratizada em todos os turnos.

Receber em casa um funcionário de uma rede de TV a cabo pode ser um risco, mesmo ele usando uniforme e portando crachá. Se a visita foi sugerida pela “empresa”, você abre a porta para um meliante e o convida a entrar.

Atender ao telefone é um risco: você pode ouvir alguém que grita por socorro, anunciando-se como um filho sequestrado (golpe manjado, mas sempre perturbador), ou, pior, ouvir uma gravação com a voz do Moacyr Franco conversando com você como se fosse um primo querido.

Trabalhar é um risco: é possível que você não receba seu salário em dia. Não trabalhar, mais ainda: chegamos a 14 milhões de desempregados.

Não falei de política porque nesse setor vai tudo bem, obrigada. Estamos na mão de gente muito decente, que não perde tempo tramando para manter cargos e privilégios, e sim focada em colocar o país nos trilhos (ainda que sem trens) rumo a um crescimento sustentado pela educação e por uma honesta gestão pública. Tão sortudos quanto nós são os Estados Unidos, que também são presididos por um homem muito sensato e íntegro. 

Mas, se você não concorda, pode pegar um avião (consulte antes se os outros passageiros são coxinhas ou petralhas, para não haver turbulência interna) e viajar para algum país europeu. Basta ter cuidado ao circular pelas ruas – não pelo estado das calçadas, que lá elas são melhorzinhas que as nossas, mas para correr a tempo no caso de topar com um simpatizante do terrorismo pilotando uma van.

And I think to myself what a wonderful world.

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