sábado, 14 de fevereiro de 2015


15 de fevereiro de 2015 | N° 18074
CLÁUDIA LAITANO

Martha Medeiros está em férias e retorna na edição do dia 1º de março

Espelho, espelho meu, quem sou eu?

Estamos chegando ao estágio em que rostos familiares desaparecem para dar lugar a uma máscara vagamente inspirada nos traços originais

Comparadas com os drones, a impressora 3D e as raquetes de matar mosquito, as técnicas que prometem rejuvenescimento ainda têm muito no que evoluir Donatella Versace e Mickey Rourke estão aí para provar.

Se você conhece uma pessoa que já passou dos 40 e parece muito mais nova do que realmente é, pode apostar que ela come bem, dorme oito horas toda noite e faz exercícios regularmente. Agora, se você encontrar uma pessoa que já passou dos 40 e parece uma versão alterada de si mesma – não necessariamente mais jovem ou mais bonita –, é provável que ela tenha recorrido a alguma intervenção estética que não deu muito certo.

Bocas inchadas, bochechas esticadas e olhares paralisados podem ser muito assustadores, mas de certa forma nos acostumamos a eles. Agora estamos chegando a um novo estágio, aquele em que rostos familiares simplesmente desaparecem para dar lugar a uma espécie de máscara vagamente inspirada nos traços originais. Foi o que aconteceu no ano passado com a atriz Renée Zellweger e parece ter se repetido agora com Uma Thurman. Ambas tornaram-se assunto na internet por terem ficado irreconhecíveis depois de algum tipo de procedimento exageradamente invasivo.

Sim, o povo gosta de fofocar, e o visual de mulheres famosas é aparentemente um manancial inesgotável para especulação, mas há algo perturbador nesse tipo de transformação abrupta e radical de um rosto conhecido. Deixando de lado qualquer discussão a respeito do tipo de pressão, interna ou externa, que leva uma mulher a alterar a própria fisionomia, o fato é que reagimos a essas modificações de forma visceral. O industrioso cérebro humano, treinado para reconhecer pessoas e detectar as mínimas variações de uma expressão facial, parece ter dificuldade para processar o significado dessa quebra de expectativa.

Não que nosso aspecto não mude o tempo todo. Se não fizermos nada a respeito, a natureza modificará nosso rosto como um cirurgião plástico diligente e meticuloso. Vai transformar a criança na adolescente, a mocinha na mulher, a mulher madura na mais madura ainda.

Todo dia, fará um retoque discreto, quase imperceptível, e já estará trabalhando há algum tempo quando olhamos no espelho e nos damos conta de que ela andou agindo enquanto estávamos distraídas fazendo outra coisa. Ainda assim, nenhuma mulher acorda aos 50 espantada por não ter mais o rosto que tinha aos 25. De alguma forma, a natureza nos dotou dessa mágica sensação de continuidade e identidade que muitos neurocientistas sugerem, hoje, que se trata apenas de uma ilusão.


Ilusória ou não, essa sensação de que a aparência reflete a nossa essência não está necessariamente ligada à beleza ou à idade, e portanto nem sempre poderá ser recuperada (ou descoberta) na mesa de um cirurgião plástico.

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