POR AMY
O’LEARY
No mundo dos jogos virtuais, o assédio sexual é
real
Jogadoras são insultadas e ouvem
propostas indecentes
Quando Miranda Pakozdi participou
neste ano do torneio de videogame Cross Assault, o técnico do seu time, Aris
Bakhtanians, perguntou-lhe diante da câmera sobre o tamanho do seu sutiã.
Em seguida, pediu que ela tirasse
a blusa e focou a webcam da equipe no peito, nas pernas e nos pés dela.
Para Pakozdi, 25, uma jogadora
experiente, foi demais. E, ao ouvir Bakhtanians defendendo o assédio sexual
como parte da "comunidade dos jogos de luta", ela desistiu da
disputa.
Machismo, racismo, homofobia e
xingamentos em geral são fatos comuns e tradicionais em certos redutos dos
games on-line.
Mas o episódio do Cross Assault
foi o primeiro em uma série de casos neste ano que expuseram a gravidade do
assédio enfrentado por muitas mulheres nas comunidades virtuais de jogos.
Os executivos desse setor que
movimenta US$ 25 bilhões por ano estão atentos. Em fevereiro, a LevelUp, canal
da internet que transmite competições de games, afastou dois comentaristas que
praticaram assédio na frente das câmeras e apresentou um pedido formal de
desculpas.
Apesar disso, Tom Cannon,
cofundador do maior torneio de game de lutas, o EVO, retirou o patrocínio da
sua empresa para o evento semanal da LevelUp, alegando a necessidade de conter
o "discurso ignorante e odioso".
No caso de Bakhtanians, que teve
suas ações no Cross Assault registradas em vídeo, ele divulgou um pedido de
desculpas.
Mas as questões despertadas pelo
episódio atraíram mais atenção com a campanha feita em maio por Anita
Sarkeesian para arrecadar US$ 6.000 no Kickstarter, a fim de documentar como as
mulheres são retratadas em videogames.
Suas páginas no YouTube e no
Facebook foram imediatamente inundadas por dezenas de comentários raivosos.
Pessoas tentaram sabotar suas
contas on-line. Ela recebeu violentas ameaças pessoais.
Sarkeesian respondeu documentando
o assédio e postando na internet as montagens fotográficas pornográficas feitas
por seus detratores com a imagem dela.
Perplexos, seus apoiadores doaram
mais de US$ 150 mil, o que irritou ainda mais seus críticos. Um homem de
Ontário criou um jogo na internet em que o objetivo é "socar"
Sarkeesian.
"O setor dos games está na
verdade num processo de mudança", afirmou Sarkeesian.
"Essa é uma coisa realmente
positiva, mas acho que há um pequeno grupo de jogadores homens que sentem que
os jogos lhes pertencem e que estão realmente aterrorizados diante dessa
recente mudança."
Quando o jogador Sam Killermann,
de Austin (Texas), viu a reação ao projeto de Sarkeesian, decidiu iniciar a sua
própria campanha, chamada "Jogadores Contra a Intolerância", na qual
pediam às pessoas para acatarem o compromisso de apoiar um comportamento mais
positivo.
Seu site recebeu 1.500 adesões
antes que hackers o invadissem e apagassem a lista de nomes.
A exemplo de Sarkeesian, muitas
jogadoras estão documentando suas experiências em blogs como o "Fat, Ugly
or Slutty" ("Gorda, Feia ou Vadia", insultos habituais às
mulheres na internet).
Ele cataloga xingamentos, ameaças
e propostas indecentes dirigidos às mulheres durante os jogos e campeonatos virtuais.
Jessica Hammer, pesquisadora da
Universidade Columbia, em Nova York, disse que o percentual de mulheres nos
jogos on-line varia de 12% a quase 50%, dependendo do tipo de jogo.
A presença feminina costuma ser
criticada como uma "distração". Algumas mulheres recebem ofertas de
dinheiro ou "ouro" digital para fazerem sexo virtual. Algumas são
perseguidas dentro e fora da rede.
James Portnow, designer que
trabalhou nos jogos Call of Duty e Farmville, escreveu sobre o assédio para a
sua série de animação na web, a "Extra Credits".
Diz o narrador: "Neste
momento, é como se déssemos ao valentão da escola o acesso ao sistema de
comunicação interna e lhe disséssemos que todo mundo iria escutar o que ele tem
a dizer. É hora de retirarmos esse megafone".
No fim do vídeo, o espectador era
convidado a mandar um e-mail à equipe do Xbox Live, na Microsoft, pedindo
mudanças nas ferramentas de comunicação e melhoras no sistema de denúncias
on-line.
A Microsoft confirmou que está
trabalhando em melhorias nas suas ferramentas comunitárias. "Na maior
parte do tempo, as pessoas viram os games como um passatempo infantil e nós,
como indústria, estivemos por trás dessa ideia", disse Portnow.
"Mas isso não é mais
verdade. Somos um meio de comunicação de massa real e temos um efeito real
sobre a cultura. Precisamos dar um passo além dessa ideia de que nada que
pudermos fazer poderia ferir as pessoas."
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