07
de agosto de 2012 | N° 17154
FABRÍCIO
CARPINEJAR
Pac-man sempre vai morrer num
beco
O
homem é um produto frágil demais. Pode ser destruído simplesmente pelo
saca-rolha.
Eu
tremo ao abrir uma garrafa de vinho. Vá que a rolha esteja esfarelada e afunde.
O longo esforço de maturação da bebida, depois de dois anos de envelhecimento
no barril e três na garrafa, morre em segundos pela minha imperícia. Nenhum dos
presentes vai mexer o líquido rubro no cálice e cheirar o buquê por minha
culpa.
O
medo tem uma razão especial: a esposa é que me alcança a safra. Representa um
ato de confiança, um crédito no relacionamento. É coisa de macho. Ela finge se
distrair enquanto observa o desempenho pelo rabo dos olhos.
E se
eu vacilo e ela delega a atividade para a visita? E se a visita abre com
facilidade e solta um risinho diabólico?
Toda
garrafa de vinho traz uma mensagem de S.O.S. Apelo de náufragos do amor.
O
champanhe é também uma tragédia moral. Festa da virada, contagem regressiva 10,
9, 8, 7, 6, 5, 4, 3, 2, 1, e você se demora ao puxar o lacre. O mundo familiar
aplaude, grita, e a garrafa permanece fechada em sua mão. É azar para o resto
da vida amorosa, não somente para um ano.
Nossos
maiores constrangimentos baixam nos pequenos atos, onde não há coragem, mas
apenas obrigação. É se enxergar no dever de fazer, que o fracasso é certo.
Não
são tarefas maiúsculas, em que podemos nos perdoar pela concorrência e
nervosismo, como vestibular, autoescola e entrevista de emprego.
Refiro-me
a situações coloquiais, da rotina, na qual o outro conclui que você não terá
dificuldade.
Um
dos vexames da escola foi ao bancar o educado com uma colega. Eu me ofereci
para abrir seu salgadinho Pingo d’Ouro. Suava frigoríficos, e não descolava as
pontas. Até que exagerei e o saco rasgou-se inteiro.
Já
penei com uma lata de extrato de tomate. Não fui ensinado a usar o abridor pela
mãe, pai, irmão mais velho (afinal, quem era o responsável pela aula?). No
casamento, na primeira refeição a dois, dividindo romanticamente o balcão da
cozinha, ganhei a ingrata tarefa. Desenhava a tampa e nada de furar a lata e
encontrar a polpa. A massa pronta, a mulher aguardando e eu batendo cabeça por
15 intermináveis minutos. O avental foi curto para conter o al sugo do rosto.
Experimento
sucessivamente suspiros de alívio ou engasgos de aflição diante de potes de
geleia, requeijão e pepino.
Dói
quando sua companhia compra ingresso para assistir a você se estrebuchar.
Dói
quando você recorre à camisa para torcer a tampa.
Dói
ainda mais quando ela consola:
–
Não depende de força, mas de jeitinho.
É
uma das frases mais horríveis de se escutar na vida, junto com “isso acontece!”.
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