quarta-feira, 15 de abril de 2009



15 de abril de 2009
N° 15939 - MARTHA MEDEIROS


Adriano, o imperador

Se eu já entendia pouco de futebol quando frequentava os estádios, hoje entendo menos ainda. Sigo torcedora do Inter e da Seleção, mas me peça para dizer o nome de 10 jogadores brasileiros que estejam na ativa e eu vou me resumir aos inevitáveis Ronaldinhos e a mais alguns poucos.

Adriano não entraria nesse “alguns poucos”. Não lembrava da sua existência até ler a respeito da sua decisão de dar um tempo para os campos: o craque resolveu repensar sua vida, enquanto retoma velhos hábitos, como andar de chinelo de dedos e ficar de prosa com os amigos que deixou na Vila Cruzeiro, lugar onde se criou.

A notícia de sua temporária desistência tem sido acompanhada por um inevitável “aí tem”. Especula-se sobre uso de drogas, depressão, baladas, mesmo o jogador afirmando que não é nada disso. Pode ser que aí tenha ou que não tenha: só ele conhece seus motivos secretos, e talvez nem sejam secretos – vamos supor que ele esteja sendo sincero.

É muito difícil a opinião pública acreditar que alguém que conseguiu realizar um sonho que outras milhões de pessoas também sonharam (e não alcançaram) de repente desista de tudo sem explicações mais bombásticas do que um simples “não quero mais”.

Adriano, que era um moleque de periferia, começou a jogar bola e através dela ganhou notoriedade e muito dinheiro. Rompeu fronteiras, foi viver na Europa e teve o mulherio a seus pés, como acontece com qualquer celebridade do esporte.

O mesmo pode acontecer com um ator amador que desponta para o estrelato depois de uma novela, ou com um cantor que vivia no morro e ganhou fama internacional, ou com uma garota que não era ninguém e hoje é modelo e vive num dúplex em Manhattan.

A gente sabe que uns poucos eleitos realizam seu conto de fadas. O que não costuma acontecer é o eleito se sentir oprimido por essa nova vida – ou ele se adapta naturalmente ou se adapta na marra, mas largar o osso, nem pensar.

“Quero ser o Adriano de antes”, disse o jogador em entrevista coletiva. E todo mundo lhe apontou o dedo como se ali houvesse um farsante. É obrigatório seguir em frente, é proibido dar meia-volta.

Ainda mais quando o “antes” é totalmente desglamorizado, quando o “antes” é um lugar sem fotógrafos, quando o “antes” é superpovoado por gente que sonha justamente em sair dali. Como Adriano se atreveu a buscar outro caminho para a felicidade que não o do sucesso?

Para alguns, viver no Exterior sem amigos e sem referências culturais é um suplício que não vale as mordomias que se recebe em troca. Não é comum, mas qualquer pessoa tem o direito de achar enfadonho viver sob holofotes e ter seu desempenho julgado o tempo todo, e em função disso questionar o rumo que sua vida está tomando.

Qualquer Adriano ou José ou Maria que ganhe um salário milionário e tenha passe livre para as benesses da vida pode não ver encanto nisso. Recusar oportunidades de crescimento não parece uma atitude esperta, mas não deixa de ser interessante testemunhar alguém desdenhando a glória numa época em que a glória passou a ser uma obsessão coletiva.

Nenhum comentário: