quarta-feira, 3 de dezembro de 2008



03 de dezembro de 2008
N° 15808 - MARTHA MEDEIROS


Se “acham” e se perdem

Tem se falado muito em Woody Allen em função do sucesso que Vicky Cristina Barcelona tem feito, e também por causa do livro de entrevistas que acaba de ser lançado, em que o jornalista Eric Lax reúne, em quase 500 páginas, as diversas conversas que teve com o diretor desde que ele começou a dirigir seus primeiros filmes, há mais de 40 anos. Estou lendo o livro e percebe-se que Allen, nessa longa trajetória, mantém-se o mesmo sujeito desencanado.

Desencanado? Aquele paranóico?

Não estou falando das neuras, fobias e ansiedades que o diretor nunca escondeu de ninguém e nas quais se baseou para criar roteiros formidáveis. Estou falando sobre ser desencanado da fama.

Desencanado dessa necessidade que tantos artistas têm de se apresentar ao mundo como semideuses. Woody Allen só marcou presença na capa das revistas de fofoca uma vez: quando se separou da atriz Mia Farrow para se casar com a filha adotiva que essa teve com o primeiro marido.

A asiática Soon-Yi era uma adolescente, e o escândalo estava armado. Woody Allen foi tratado como pedófilo e apostava-se que a tara seria passageira, mas o casal segue junto até hoje e os ânimos se acalmaram: não era tara, era amor. Que decepção.

Afora esse episódio polêmico, Allen é notícia apenas pelos seus filmes. Não freqüenta baladas e não tem o ego inflado. Ao contrário: sua maior excentricidade é ser tímido e se espantar quando o chamam de gênio.

Cada vez me convenço mais de que aqueles que são gênios são os únicos que conseguem prescindir da autopromoção excessiva e manter-se com os dois pés fincados no solo. É por duvidarem de si mesmos que evoluem a cada dia.

Esse assunto me ocorreu porque, numa recente viagem a trabalho, passei 24 horas em companhia de uma produtora de eventos e ouvi histórias incríveis.

Soube de atrizes de terceiro escalão que cobram R$ 70 mil para fazer a apresentação de um seminário (um boa-tarde na entrada e um boa-noite na saída:

R$ 70 mil!), atores mal saídos das fraldas que exigem mordomias de veteranos, sem falar no que a gente sabe pelos jornais – atrizes histéricas pela falta de comida light no camarim e megastars exigindo que troquem todos os assentos dos vasos sanitários por onde irá passar com sua turnê – e nada de comida nativa, eca.

Podem? Claro. A graça da coisa talvez seja essa. Já que são perseguidos por paparazzi, já que têm sua vida íntima investigada, já que não podem caminhar num parque sossegados, compensam agindo como seres de outro planeta e tendo acessos risíveis de megalomania.

Mas eu ainda prefiro rir das piadas inteligentes que Woody Allen insere em seus filmes, aqueles que ele dirige entre um acesso de modéstia e outro.

Aproveite o dia - Tenhamos todos uma ótima quarta-feira

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